Aqui há cacos!

Aqui há cacos!

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Por estes dias, a Jornada Mundial da Juventude (JMJ) 2023 é o mote para as conversas e as notícias que os média todos os dias nos oferecem. Fala-se, discute-se, critica-se, elogia-se… Ouvem-se verdadeiros testemunhos de conversão, estendem-se tapetes da vergonha, que contrastam com a alegria do acolhimento a que muitos, por todo o país, se dispõem, convidando a entrar quem chega e partilhando o que têm.

No campo alimentar saltitam notícias sobre bolos e bolachas que tentam cativar clientes utilizando o tema como mote, e, sobre a mesa de Deus, não deixei de sorrir com aquela notícia que anunciava que as hóstias usadas nas eucaristias destas Jornadas vão ser feitas com trigo mole produzido no Alentejo. Parece que estão a querer dizer-nos que, para o essencial, o Alentejo ainda produz trigo, e que por isso ainda há esperança de voltar a ser o celeiro de Portugal, que o Estado Novo tentou enfatizar. Quem por lá passa, ou lá vive, sabe que essa realidade é, por agora, uma miragem. De qualquer forma nem só o Alentejo produziu trigo ao longo dos séculos e, pelo que vou ouvindo, actualmente há regiões onde já se fazem produções interessantes de trigo tradicional.

As hóstias ou obreias na doçaria

Mas voltemos às hóstias ou obreias, essas folhas delgadas de massa de farinha sem fermento, e olhemo-las como ingrediente da nossa cozinha tradicional. Feitas com a flor da farinha, fina e delicada, aquela que mais nutria, segundos os conceitos alimentares mais antigos, muito cedo atraíram as doceiras e as madres conserveiras para envolver certos doces. Desde o livro de Cozinha da Infanta D. Maria, quer dizer, desde o século XV/XVI, que as observamos a servirem de base aos massapães. Um doce feito de amêndoa e açúcar que vai a cozer ao forno sobre obreias, “cada uma o seu”. Todavia, ao longo dos séculos, e com uma certa arte doceira muito centrada nos conventos, onde porventura também se faziam as hóstias, a obreia foi-se alargando a muitos outros doces. Naquele mesmo tratado de cozinha observamos que os canudos de ovos eram feitos com uma massa frita e depois recheados com ovos-moles, e, já no século XVII, em outras fontes documentais, percebe-se que os ovos-moles eram apresentados em tigelinhas e os celestes iam a cozer ao forno sem qualquer protecção. Esta realidade nos inícios do século XVIII já começa a mudar. Francisco Borges Henriques, para além dos massapães, também já se aventura em outras receitas, como um bolo em camadas de obreia com recheio de ovos, manteiga e massa de pão ou uns ovos-moles brancos para comer logo, onde refere que se podem deitar “em tigella, ou pratos com canella por sima” ou “em prato com obreias doces feitas em canudo”.

Chegamos ao século XIX com inúmeros doces envolvidos em obreia, sendo tradicionais em Braga, para além dos massapães, os celestes e o chamado doce fino, ou seja, pequenos canudos ou rissóis de obreia recheados com ovos-moles.

O fabrico de hóstias em Braga e o nascimento dos cacos

Mas sendo a cidade de Braga a Roma de Portugal sabemos que aqui existe, também, uma verdadeira indústria de fabrico de hóstia. E vai daí, há uns anos atrás, os seus fabricantes resolveram começar a comercializar os restos que eram rejeitados e que se davam aos vizinhos ou às crianças mais próximas. E foi assim que nasceram os “cacos”, que hoje se vendem por todas as pastelarias da cidade, com o epíteto de “Aqui há cacos!”. Um “doce” que não é doce. Uma iguaria que vai bem simples ou com café ou chá. Todavia, dizem alguns especialistas que também vai muito bem com vinho de missa, uma bebida da qual nada sei, mas que me deixa curiosa…

Uma nova tradição, esta a dos cacos, a explorar!!


Imagem: IMA


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Acerca do Autor

Anabela Ramos

Historiadora.

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