No dia 6 de Novembro, a Casa Amarela – Galeria Municipal de Castelo Branco abriu as portas ao público para inaugurar a exposição de três criações fotográficas integradas no projecto Rastro, Margem, Clarão, da Terceira Pessoa, uma estrutura albicastrense dedicada às artes performativas. Desde Janeiro de 2020, um colectivo de três fotógrafos, três ensaístas e três duplas de actores e performers têm lido, pensado e prolongado a escrita de Rui Nunes (n. 1945), um escritor português que conta com mais de 50 anos de vida literária, explorando obsessões como o mal, a morte, o corpo, os mitos da identidade nacional – e os próprios mitos da literatura. Isto é: da escrita enquanto representação falível e cínica de um mundo que, desde há muito, finge acreditar no torpor do seu balanço, como se ainda pudesse gozar do luxo da ingenuidade: “as belas-letras. Aplica-te. Esforça-te. Até tornares a dor, a morte, o mundo, uma ficção. Dá a cada palavra uma história completa para poderes esquecer. / As belas-letras arquivam. Tão bem!”, ironiza o autor no livro O Anjo Camponês, publicado no início deste ano pela Relógio D’Água.
Com este projecto, a associação Terceira Pessoa tornou-se na primeira estrutura de Castelo Branco a receber um apoio sustentado pela DGArtes (Direcção Geral das Artes) para o biénio 2020/2021, na área dos cruzamentos interdisciplinares, um terreno que tem sido caro e fecundo a Ana Gil e Nuno Leão, directores artísticos desta estrutura, no activo desde 2012. Os reveses da pandemia obrigaram, necessariamente, à recalendarização dos planos para os vários andamentos deste Rastro, Margem, Clarão, mas o mais importante é que todas as criações têm visto a luz do dia e potenciado encontros entre públicos – para não falar das pessoas que, assistindo aos demais espectáculos e iniciativas deste projecto, ficam intrigadas quanto aos livros de Rui Nunes, curiosas por experimentar os périplos que títulos como Sauromaquia, A Mão do Oleiro ou Nocturno Europeu abrem, não sem violência, na relação entre um leitor e um livro.
Tendo já estreado duas das três performances deste projecto – Luz Negra, de Ana Gil e Nuno Leão, no Cineteatro Avenida, em Castelo Branco, e Querer-se morrer confortavelmente na dor, de Óscar Silva e Filipa Matta, no Teatro Municipal da Guarda –, chegou a vez de se dar a conhecer ao público os trabalhos fotográficos de Valter Vinagre, Susana Paiva e Rui Dias Monteiro, expostos nas três salas da Casa Amarela.
Ao mesmo tempo, foram lançados três livros que constituem o testemunho crítico, hermenêutico, mas igualmente afectivo, das relações criadas entre os três fotógrafos e três ensaístas. A saber:
Basta que um pássaro voe, com fotografia de Rui Dias Monteiro e ensaio de Vítor Ferreira;
Boca, com fotografia de Valter Vinagre e ensaio de Eunice Ribeiro;
Na imprecisa visão do vento, com fotografia de Susana Paiva e ensaio de Diogo Martins.
O texto que de seguida se reproduz foi lido por Nuno Leão, director artístico da Terceira Pessoa, para apresentar os três livros deste projecto e inaugurar a exposição de fotografia. O vídeo da sessão inaugural, que contou com a presença do Presidente da Câmara de Castelo Branco, José Augusto Rodrigues Alves, encontra-se disponível nas páginas do Facebook da Terceira Pessoa e da galeria Casa Amarela.
Hoje é um dia feliz.
Não é todos os dias que se inaugura uma exposição de fotografia de 3 autores/autoras e se lançam 3 livros de fotografia e ensaio de 6 autores.
Os objetos artísticos que hoje temos o imenso prazer de partilhar são o resultado do projeto “Rastro, Margem, Clarão” da Terceira Pessoa. Um projeto que junta um coletivo de criadores de áreas disciplinares diversas como a fotografia, o ensaio e a performance em torno do universo da escrita de Rui Nunes (n. 1945). Deste projeto resultaram 3 performances, 3 exposições de fotografia e 3 livros de fotografia e ensaio. Tudo isto começou a ser criado no início de 2020; foi aí que nos conhecemos, que começámos, juntos, a criar, que começámos esta relação.
E sublinhamos aqui a palavra “relação” porque, antes, durante e depois de tudo, é isso que nos interessa: criar relações entre pessoas, entre artistas, entre estruturas, disciplinas, olhares, sensibilidades e públicos. É esse o motor que faz a Terceira Pessoa desenvolver os seus projetos: a procura de nos encontrarmos, criarmos e continuarmos relações.
Hoje celebramos os trabalhos fotográficos criados pelo Rui Dias Monteiro, a Susana Paiva e o Valter Vinagre, que se encontraram com os trabalhos ensaísticos de Vítor Ferreira, Diogo Martins e Eunice Ribeiro. Três exposições magníficas, resultantes de uma entrega e compromisso que muito nos entusiasma. E três livros de ensaio e fotografia, resultantes de uma relação dialogante e sensível entre fotógrafo/fotógrafa e ensaísta que muito nos comove.
E é esta comoção que queremos hoje celebrar, no sentido de a estimar e fortalecer, para que nos continuemos a (co)mover, a mover juntos no futuro. Hoje é um dia feliz porque é através deste gesto de partilha e abertura dos objetos que temos a possibilidade de continuarmos esta relação com mais pessoas. Serão todos/as muito bem-vindos/as a esta exposição. Cá estaremos para vos receber. Nós e os livros que podem levar e guardar convosco nas vossas casas. Gostamos de pensar que esta relação que agora começa pode chegar a essa intimidade: a de fazermos, por exemplo, parte das bibliotecas uns dos outros.
Nada disto seria possível sem o envolvimento dos autores e das autoras: Rui, Vítor, Susana, Diogo, Valter, Eunice – o nosso profundo agradecimento pela forma sensível e comprometida como estiveram sempre neste projeto.
Um agradecimento também à equipa da Terceira Pessoa:
– à Cátia Santos (designer dos livros), pelo profissionalismo e compromisso com que conciliou as visões dos autores;
– ao Tiago Moura (videasta), pela generosidade e escuta sensível com que foi documentando todo o processo;
– ao Bruno Esteves (produtor executivo), pela forma como geriu eficazmente os meios de produção em todas as fases do processo;
– e a todas as pessoas que fazem parte da equipa da Terceira Pessoa.
Agradecemos também às estruturas de residência de criação que nos receberam – Fábrica da Criatividade de Castelo Branco e Espaço do Tempo em Montemor-o-Novo.
Para terminar, gostaríamos de deixar um agradecimento especial à Direção-Geral das Artes pelo apoio financeiro, e também à Câmara Municipal de Castelo Branco pelo apoio financeiro e logístico com que sempre, e mais uma vez, nos ajudam a cumprir os nossos sonhos e a partilhá-los com o público.
Começámos por dizer que hoje é um dia feliz e é assim que nos sentimos. Felizes por esse lugar de infinitas possibilidades que a Terceira Pessoa procura, a cada dia e sempre, continuar. Felizes por podermos partilhar com todos aquilo que mais gostamos de fazer: arriscar procurar o desconhecido, ousar criar e tecer relações.
A todos e a todas o nosso profundo agradecimento,
pela Terceira Pessoa
Ana Gil e Nuno Leão
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Algum do material teórico e ensaístico produzido no âmbito do projecto Rastro, Margem, Clarão foi divulgado na Vila Nova ao longo deste ano. Todos os ensaios e reflexões são da autoria de Diogo Martins:
“Deita o livro fora e lê”, sobre o primeiro encontro do colectivo Rastro, Margem, Clarão, na Fábrica da Criatividade, em Castelo Branco, no mês de Janeiro de 2020: https://vilanovaonline.pt/2020/01/18/dar-coisas-aos-nomes-deita-o-livro-fora-e-le/.
“A coragem do deserto: o corpo todo para ler Rui Nunes”, publicado no jornal i, em 6 de Março de 2020, a propósito do livro O Anjo Camponês, de Rui Nunes, e da primeira performance do projeto, com Ana Gil e Nuno Leão: https://ionline.sapo.pt/artigo/688248/a-coragem-do-deserto-o-corpo-todo-para-ler-rui-nunes?seccao=Mais.
Durante a residência artística do colectivo Rastro, Margem, Clarão no Espaço do Tempo, em Montemor-o-Novo, no mês de Agosto:
“A fundar distâncias (Caderno da Residência, n.º 1)”: https://vilanovaonline.pt/2020/07/31/dar-coisas-aos-nomes-a-fundar-distancias-caderno-da-residencia-n-o-1/.
“Equívocos, dissensos, desvios (Caderno da Residência, n.º 2)”: https://vilanovaonline.pt/2020/08/01/dar-coisas-aos-nomes-equivocos-dissensos-desvios-caderno-da-residencia-n-o-2/.
“Um osso exposto fractura quem o vê (Caderno da Residência, n.º 3)”: https://vilanovaonline.pt/2020/08/06/dar-coisas-aos-nomes-um-osso-exposto-fractura-quem-o-ve-caderno-da-residencia-no-3/.
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Imagens: todas as fotografias são da autoria de Nuno Leão, excepto a segunda fotografia no corpo do texto, que pertence ao arquivo da Casa Amarela — Galeria Municipal de Castelo Branco.
Projecto Rastro, Margem, Clarão – ficha artística e técnica:
Direcção Artística_ Ana Gil e Nuno Leão
Criação Performativa e Interpretação_ Ana Gil e Nuno Leão; Óscar Silva e Filipa Matta; Miguel Moreira e Maria Fonseca
Fotografia_ Rui Dias Monteiro, Susana Paiva, Valter Vinagre
Ensaio_ Diogo Martins, Eunice Ribeiro, Vítor Ferreira
Pesquisa e Teoria_ Diogo Martins
Direcção Técnica_ Pedro Fonseca / Coletivo ac Design de Comunicação_ Cátia Santos
Produção Executiva_ Bruno Esteves
Produção_ Terceira Pessoa – Associação
Financiamento_ Direção-Geral das Artes / República Portuguesa – Cultura, Cine-Teatro Avenida Castelo Branco, Teatro-Cine Torres Vedras, Teatro Municipal da Guarda
Residências de Criação_ Fábrica da Criatividade, Rua das Gaivotas 6, Cão Solteiro, Devir CaPA Centro de Artes Performativas do Algarve, O Espaço Do Tempo
Terceira Pessoa: http://terceirapessoa.pt/
Para comprar os livros da colecção Rastro, Margem, Clarão, envie o seu pedido à Terceira Pessoa por mensagem privada a partir da página de Facebook: https://www.facebook.com/terceirapessoa2012
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