bazulaque

Bazulaque!? O que é isso?…

 

 

Há comidas milenares, que atravessaram os séculos íntegras e fiéis aos seus criadores, indiferentes a guerras, mudanças sociais e revoluções, que foram mudando os caminhos da nossa civilização. Têm nomes estranhos, sabores fortes e complexos e, normalmente, deixam-se cozinhar durante longas horas. Chamam-lhe agora alguns confort food, mas eu prefiro o termo mais português de “comida caseira”.  Designam-se por sarrabulho, verde, sarapatel, cabidela, mondongo, bazulaque…

Bazulaque!? Confesso que nunca tinha ouvido falar de tal comida, mas porque, por estes dias, me surgiu em diferentes contextos, fui por aí…

De facto, ouvi há poucos dias falar de uma Confraria do Bazulaque. O que é isso? Pensei eu. Não muito tempo depois eis que volto a ler a mesma palavra num livro de gastos do Mosteiro de Tibães, em finais do século XVIII: “dei por um bazulaque para um almoço”. Ui! Também aqui? Continuei a ler e, em dois anos, são já sete os registos de pagamento de bazulaque que localizei. Num deles refere-se, ainda, que se comprou para a folga dos monges. A folga, diga-se, era um tempo de descanso da vida conventual em que os monges migravam, por um dia, para uma casa localizada fora da cerca monástica, fazendo refeições mais livres e sem obrigação de qualquer jejum ou abstinência. Era, pois, uma comida que se servia na mesa monástica. Não só dos beneditinos, mas também dos cistercienses, como veremos a seguir.

Não me vou perder na origem da palavra, nem nos significados que possam estar no advento deste cozinhado, porque a viagem seria muito longa. Fico-me pelos inícios do século XVIII quando, pela primeira vez, observo o que dela diz Raphael Bluteau: hum guisado de forçuras de carneiro, com cebola, toucinho, azeite, & vinagre, coentro, ortelaã, etc. He muy usado no Mosteiro de Alcobaça, para a cea dos monges. Por volta de 1760, Frei Luís do Monte Carmelo anota, também, que bazulaque é um guisado de fressuras de carneiro com toucinho, etc. Nada mais dizem, nem valia a pena, porque aqueles etc, que um e outro utilizam, querem dizer simplesmente que cada um acrescenta o que tiver à mão. E não vale a pena ouvir outros, porque constato que todos os que se lhes seguem vão beber nesta fonte. E aqui já temos praticamente uma receita.

Contudo, alguns textos que consultei referem que é comida de gente do campo, também servida em tempos de festa. Uma entrada que se servia nos casamentos antes da celebração da missa. Encontro-o como comida típica na freguesia de Fornelos, em terras do Douro; na região de Lousada, onde se constituiu uma confraria em 2018; e, ainda, no concelho de Marco de Canavezes. Todavia, ao olharmos o único texto publicado sobre o assunto (na Revista TriploV de Artes, Religiões e Ciências) também ficamos a saber que já é referido por algumas personagens de Aquilino Ribeiro. Em conclusão, o bazulaque andava por aqui, entre o Norte e Alcobaça, a servir de repasto aos mais simples, mas também aqueles que apreciavam um bom cozinhado, fossem pobres ou ricos.

Dizem-nos os dicionaristas que é feito com carne de carneiro, mas, em Tibães, observo que poderia ser de vitela. Enfim, são as vísceras (fígado, coração, pulmões, sangue) que depois de muito bem cozinhadas e, tal como as papas de sarrabulho, misturadas com pão, resultam num pitéu apreciado por todos.

Agora só falta experimentar um bom bazulaque e trazer todos estes saberes para mesa. Irá, com toda a certeza, ser uma experiência gastronómica muito mais interessante!


Imagem: Enoturismo


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