Canta-me, Tina, canta-me!

Canta-me, Tina, canta-me!

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Chego a casa a estas horas tardias e dou pela notícia da morte de Tina Turner. Ai, Tina, Tina, e eu que gostava e sempre vou gostar muito de ti.

Anna Mae Bullock, teu nome de baptismo. Quiseste ser Tina e pronto, és a minha Tina e eu choro a tua partida. Como diria o Baudelaire, num dos seus poemas de “As Flores do Mal”, dedicado a uma passeante fugaz que se terá cruzado com ele nas ruas da velha Paris: “Eu que te teria amado, tu que bem o sabias!”.

E tu, Tina Turner, eras bem melhor do que esse tal de Ike, eras um vulcão, com a tua voz quente, poderosa e a tua sensualidade. Isso atravessava-me, sabias? Não, não eram só as tuas pernas, que a minha gula também espreitava. Era a tua voz, a vibração total da tua alma “soul” e do teu corpo que por ela passavam.

Deste cartas, Tina Turner, tu que vieste “de baixo”, como dizem os burgueses, tu que comeste algum do pão reles que o diabo amassou, tendo que ceder aqui ou ali. Mas os meus ouvidos e os meus olhos nunca te abandonaram, sabiam-te bem melhor do que as sakiiras, as rihanas e outras frugalidades “pop star”. Até ensinaste o Mike Jagger a dançar melhor em palco. E havia tanta gente bonita, como o David Bowie, a respeitar-te.

Ad aeternum Tina Turner

Tenho discos teus e às vezes ponho-os a rolar porque preciso da vibração quente da tua voz para, de quando em quando, vencer as miseriazinhas da vida. E até pintei o teu rosto, minha querida Tina Turner, há muitos anos, naquele cantinho superior esquerdo de um quadro que dediquei ao Tom Waits. Ora vê lá, em que boas companhias te arrumo! E que as tenhas ad aeternum, e que te rodeiem os anjos musicais.

Eu cá, vou já ali à estante pescar um disco teu e embalar-me nele a ver se aplaco esta tristeza em que me deixaste. Tanta gente linda e boa a ir-se embora! Depois da Rita Lee, vais tu. Meu Deus, é um mundo caloroso, tão meu, que se desmorona.

Que tristeza, Tina Turner! Canta-me, Tina, canta-me!


Imagens: Al Kaplan / Amadeu Santos

Obs: texto previamente publicado na página de facebook de Amadeu Santos, tendo sofrido ligeiras adequações na presente edição.


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Categorias: Música, Obituário

Acerca do Autor

Amadeu Santos

Amadeu Santos nasceu em Guimarães, em 1953. Licenciou-se em Artes Plásticas/Pintura pela Escola Superior de Belas-Artes do Porto. É professor aposentado do ensino secundário. Leccionou Cultura Contemporânea na Escola Superior Artística do Porto (extensão de Guimarães). Como artista, trabalhou para diferentes galerias e expôs individual e colectivamente no país e no estrangeiro. Fez diversas palestras e orientou diversos cursos livres nas áreas da cultura artística. Trabalhou em jornalismo em Lisboa. Foi director da revista Defacto.

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