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Tudo o que é belo na vida exige paixão. Este livro desperta paixões alegres, afectos positivos, como diria Espinosa. Ele conta a história divertida e adorável dos médicos que fizeram a revolução na saúde durante a Revolução dos Cravos e que foram para a periferia do País entre 1974 e 1982. O meu papel aqui foi de encontrar um fio condutor, uma explicação científica fundamentada, mas em grande medida este livro vive de testemunhos que organizei como um puzzle que nos encanta – e encanta-nos porque a realidade foi encantadora.
Uma corrente importante na academia, herdeira do positivismo, insiste numa neutralidade que não existe, apelando ao não envolvimento emocional do investigador nos seus projetos. Além de mecanicista, ela nega as evidências científicas da neuropsicologia: é que não existe mente e coração, razão e emoção, somos um só. Sou apaixonada pela Revolução dos Cravos, esse momento excecional da história de Portugal em que milhões de pessoas mudaram a vida mudando o país que as mudou.
Quando escrevi, em 2012, a História do Povo na Revolução Portuguesa era para mim claro que faltava um capítulo: o da saúde na revolução. Neste livro que aqui vos deixo tive finalmente a oportunidade de preencher esta lacuna. Mergulhei na minha hipótese – o Serviço Nacional de Saúde não tinha sido construído em 1979 por decreto, mas por um longo processo que tinha começado em 1974, com a gestão democrática dos hospitais, as carreiras médicas e o Serviço Médico à Periferia. Para isso, os médicos e os profissionais de saúde tiveram um papel primordial, imprescindível. O seu desenho, a sua realização, dependeu destes médicos, apaixonados pela sua profissão, por um sentido do trabalho, ética profunda do cuidar. E pela ideia estratégica de um novo país.
O SMP é exemplar no mundo, tendo antecipado no terreno o que viria a ser definido pela Organização Mundial de Saúde, em Alma Ata, em 1978, como estratégia na saúde para as comunidades periféricas. Ao construírem e lutarem pelo Serviço Médico à Periferia os médicos conseguiram as carreiras médicas, sem as quais não podia existir Serviço Nacional de Saúde. Na periferia (às vezes periferia era a 15 km de Lisboa) encontram-se as mais divertidas, caricatas e emocionantes histórias em que os médicos se superaram, deixando para sempre uma marca na sua formação profissional. Os médicos partiram, jovens, em busca de um país que ainda não existia de facto, ajudaram a construir este país, e colocaram Portugal com o 12º melhor SNS do mundo em apenas 25 anos, entre 1974 e o quarto de século seguinte. Este trabalho, um serviço de saúde universal num país destruído por uma guerra colonial que engolia 40% do orçamento do Estado, não podia ter sido, como creio ter demonstrado, realizada por decreto.
Este é o principal mérito da chamada história social do trabalho: mais do que de grandes personagens e grandes datas trata-se, sobretudo, da grandeza de homens e mulheres comuns elevados à condição de ser genérico ao serviço da humanidade em momentos, esses sim, extraordinários. Só pelo empenho e gestão democrática, que permitiram uma dedicação e motivação ímpares destes profissionais levando quase tudo onde não havia quase nada.
Como recorda um médico dos muitos que ouvi, a seguir ao 25 de Abril levou a mãe, alentejana, a ir ver o mar. A mãe tinha tido pela primeira vez médico de família. Olhou o mar, maravilhada e respondeu-lhe: “É lindo, filho, mas não se compara com a minha médica de família!”
Espero que se apaixonem por este livro e se divirtam tanto a lê-lo como eu me diverti, na verdade deleitei, a escrevê-lo. Estas paixões alegres espinosianas só as podemos ter como escritores e leitores porque alguém as viveu e construiu na realidade: os médicos, entre 1974 e 1982, verdadeiros fundadores políticos do SNS, pais e mães da revolução na saúde depois do 25 de Abril.
Obs: ‘Raquel Varela, Conclusão do livro Uma Revolução na Saúde. História do Serviço Médico à Periferia, Julho de 2020′
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