Cineclube | Diamantino (2019) de Gabriel Arantes e Daniel Schmidt

Cineclube | Diamantino (2019) de Gabriel Arantes e Daniel Schmidt

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Diamantino, exímio jogador de futebol, é uma estrela mundial conhecida não só pelo seu talento, mas também por dois ingredientes que se misturam em doses iguais: ingenuidade e ignorância. Um dia, depois de um episódio que o deixa profundamente abalado, perde a desenvoltura em campo e vê a sua carreira terminar abruptamente. É assim que, em busca de um novo propósito para a vida, se depara com assuntos sobre os quais nunca antes tinha refletido – entre eles, a crise dos refugiados, o neofascismo e a manipulação genética”.

Diamantino conquistou, em Cannes, em 2018, o Grande Prémio da Semana da Crítica, e tem sido objeto de culto um pouco por todo o mundo. Nascido da experimentação e liberdade dos realizadores Gabriel Arantes e Daniel Schmidt que se decidiram a realizar trabalho sobre um Portugal distópico dos nossos dias após terem co-realizado várias curtas-metragens, o filme tem sido frequentemente bem classificado entre a crítica. De Diamantino diz-se que é bem humorado, inteligente, brilhante e até mesmo fofo.

Diamantino é o futebolista que talvez possa salvar Portugal do esquecimento”, brinca, em registo semelhante ao estilo do filme, Vasco Câmara no Público. “É o Miguel Ângelo do século XXI, alguém “que mexe com as pessoas como mais ninguém”. [Gabriel] Abrantes queria uma personagem “icónica” que permitisse “um reconhecimento imediato a um público mais alargado”. Queria “um novo mito português”. Abrantes – deixa de ser segredo às primeiras imagens – queria um Cristiano Ronaldo”.

“O projeto luso-brasileiro começa no espaço sideral. Partindo das galáxias, adentramos a Terra, Portugal, e depois um estádio de futebol. A porta de entrada para este universo é a estranheza, como se o olhar proposto ao público viesse de um visitante muito distante – um alienígena, talvez. O ponto de vista estrangeiro é perfeitamente adequado para imergir na jornada de bizarrices e exageros de Diamantino“, ressalta Bruno Carmelo em AdoroCinema.

“Diamantino começa realmente como paródia ou sátira (dependendo do grau de acidez que se lhe quiser atribuir) da maior estrela do futebol português contemporâneo. E o retrato começa na caricatura”, confirma Ricardo Vieira Lisboa em À Pala de Walsh. Citando o realizador na apresentação do filme na abertura do QueerLisboa, “este é um filme sobre uma pessoa tão cândida, tão naïf, que se permite experimentar coisas para as quais nenhum de nós teria disponibilidade”, acrescenta ainda ser esse “o grande achado do filme, próprio de uma metragem mais larga: dar espaço à sua personagem para sair da mera caricatura (que dada a sua força é algo difícil e nunca totalmente conseguido), mostrando-se afinal figura doce e romântica, num romantismo de derreter corações.

Diamantino encara a androginia do seu protagonista e o travestismo da sua namorada da forma mais aberta possível, quebrando todas as fronteiras e deliciando-se nas ambiguidades – como diria Botto, é aí que é “mais gostoso”.

E é aqui que convém centrar o olhar: na ambiguidade que o filme sempre trabalha entre o brincar e o levar-se a sério, entre o conteúdo político e a simples rêverie surrealista, entre a paródia e a sinceridade para com o seu protagonista. É exatamente nessas áreas cinzentas que o filme parece deliciar-se, deixando o espectador sempre em riste, incerto se será de mau gosto fazer piadas sobre os refugiados ou ridicularizar o sotaque madeirense”. Diamantino urde a sua teia no fio do “politicamente correto” e aí reside boa parte do seu sucesso. “Se se observar o filme atentamente percebe-se que grande parte das suas saídas humorísticas têm um enorme poder disruptivo que parte sempre da posição do espectador, isto é, quase sempre rimos-nos juntamente com os “maus” da fita. A nossa postura de espectadores moralizantes é posta em causa sucessivamente, até que, no final, só há lugar para a empatia“.

“Estamos no terreno da caricatura assumida: o jogador é ignorante e talentoso na mesma medida”. Mas, aos poucos, o humor perde a força, sobretudo devido à repetição de metáforas e de as ideias serem pouco aprofundadas”, relembra Bruno Carmelo. “Existe um frescor juvenil na maneira de filmar, sem medo do ridículo e mesmo do amadorismo, em ambos os sentidos do termo. Faltou a este caos colorido adotar uma noção de controle, ou pelo menos de coesão nas escolhas e discursos. A crítica final esvazia-se pela direção deslumbrada com suas próprias ferramentas. Diamantino certamente despertará muitas risadas, mas também uma pequena frustração pelas oportunidades perdidas”, conclui.

Apesar de tudo, o realizador Gabriel Arantes “assume uma relação “extremamente distante” com o futebol. “A minha relação é narrativa, interessam-me os méritos da narrativa e da estética”, confessou o autor a Vasco Câmara. Contudo, “a distância no cinema de Abrantes é uma irreversibilidade. Tudo se joga num espaço virtual, onde se projecta uma quimera de géneros – o thriller, o melodrama, a comédia screwball, a fantasia –, onde eles são simulados. Como uma clonagem”.

Diamantino (2018) de Gabriel Arantes e Daniel Schmidt será exibido pelo Cineclube de Joane, em Vila Nova de Famalicão, na Casa das Artes, na próxima quinta-feira, 13 de junho, pouco depois da sua estreia absoluta em Portugal, ocorrida apenas em 4 de abril. Na semana seguinte, em 20 de junho, será vez de o Cineclube Octopus exibir o filme no Cine-Teatro Garrett, na Póvoa de Varzim.

Ficha técnica

Título original: Diamantino

Realização: Gabriel AbrantesDaniel Schmidt

Atores: Carloto CottaCleo TavaresAnabela Moreira

Género: Comédia, Fantasia; Classificação: M/14; Outros dados: POR, 2018, Cores, 96 min.

Diamantino (2018) de Gabriel Arantes e Daniel Schmidt – trailer

 

Imagens: Gabriel Arantes e Daniel Schmidt

Obs: Edição em 11062019, 8:36, com referência à exibição na Póvoa de Varzim.

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