Redescobrir a ‘História do PCP na Revolução dos Cravos’ de Raquel Varela no 100º aniversário do Partido

 

 

“Na história da história portuguesa, esse livro ficará registado como a obra que dissipou difinitivamente um dos mais extraordinários e persistentes equívocos da época contemporânea: o absurdo mito de que o Partido Comunista Português (PCP) visou acaparar-se do poder por intermédio de um golpe de mão, entre o verão e o outono de 1975, tendo finalmente tentado a sua sorte – e falhado, no dia 25 de novembro daquele ano. Como acontece com muitos equívocos, esse aqui deveu grande parte da sua longevidade a um certo pacto de entendimento tácito entre o caluniador e o caluniado”, destacou Ângelo Novo, historiador independente, a propósito desse mal-entendido em que o país viveu durante três dezenas e meio de anos e que ainda hoje se reflete nos ditos de muitos portugueses.

Sem sombra de dúvida, o Partido Comunista Português (PCP) desempenhou um papel central no processo revolucionário português, iniciado a 25 de Abril de 1974 com um golpe de Estado liderado pelo Movimento dos Capitães / Movimento das Forças Armadas (MFA). Na investigação desenvolvida para a redação de ‘História do PCP na Revolução dos Cravos‘, Raquel Varela analisou “a política do PCP face ao desenrolar do processo revolucionário, sobretudo em relação ao movimento operário e popular, realçando a participação do partido nos principais conflitos sociais, nas greves, nas fábricas e nas empresas, no processo de nacionalizações e na luta pela reforma agrária. Pela sua relevância para a história da Revolução e do período democrático que se lhe seguiu demos especial relevo à política do Partido Comunista face aos organismos de duplo poder (comissões de trabalhadores, moradores e soldados) e à construção da Intersindical como central sindical única. Orientámos ainda esta pesquisa para focar a política do PCP em relação ao Partido Socialista e ao MFA durante a revolução. Destacámos em particular a posição do PCP face aos Governos Provisórios, à organização das Forças Armadas e ao MFA e ainda a disputa entre PS e PCP pela organização do aparelho de Estado”, contextualizou Raquel Varela aquando da publicação do livro, nos idos de 2011.

No livro, a autora relata e demarca o papel que o Partido Comunista Português na revolução de Abril de 1974 e nos momentos que a sucederam a partir de um extenso trabalho de pesquisa. Aliando o rigor científico – o texto parte da sua tese, coordenada pelo historiador António Costa Pinto e pelo politólogo Carlos Taibo, professor da Universidade Autónoma de Madrid e colunista, entre outros, do El País e da rádio Cadena Ser – ao texto para o grande público, a autora oferece um documento de enorme importância para a compreensão de um dos momentos ainda mais discutidos da História recente de Portugal”.

“O que aconteceu no 25 de Novembro foi muito diferente da versão que os vencedores quiseram fazer acreditar no calor dos acontecimentos para justificar a quartelada. O mais surpreendente, no entanto, foi o posicionamento do PCP durante o desenvolvimento da fulminante acção militar da madrugada de 25 de Novembro. O PCP não fez absolutamente nada. Até hoje, uma das chaves para a compreensão da derrota da revolução social em Portugal foi este quietismo”, testemunhou Valério Arcary, historiador, no Prefácio de um livro que regista uma versão da história diferente da habitual.

Abordagem crítica e controversa

“O livro de Raquel Varela analisa pela primeira vez, numa obra de natureza académica, o papel politico especificamente desempenhado pelo Partido Comunista Português no processo revolucionário de 1974-1975″, referiu, por sua vez, Fernando Rosas, professor catedrático da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa e reconhecido historiador do Estado Novo.

E trata-se efetivamente de um processo revolucionário aquele que atravessou e abalou Portugal durante esse período. Conforme a autora narra, em entrevista concedida a Ricardo Lara e Mauri Antonio da Silva, da Universidade Federal de Santa Catarina, no Brasil, esta “é uma das revoluções mais  importantes de todo o século 20: pela extensão da dualidade de poderes (comissões de trabalhadores, moradores, soldados). É também, e essa é outra característica importante, uma revolução na metrópole que se dá por força das revoluções anticoloniais (guerra colonial) nas colónias portuguesas. É uma revolução democrática que se transforma numa revolução social. Aquilo que começou a 25 de abril – um clássico golpe de Estado – é a semente de uma revolução social (que imprime mudanças nas relações de produção), encetada como uma revolução política democrática (que muda o regime político)”.

A ‘História do PCP na Revolução dos Cravos‘ “fá-lo de forma bem sustentada, construindo uma abordagem inovadora, ainda que naturalmente controversa, de um período crucial da nossa história do século XX”, acrescenta Fernando Rosas.

Por outro lado, Carlos Taibo, professor de Ciência Politica da Universidade Autónoma de Madrid, também se lhe referiu dizendo que este livro “oferece uma visão crítica e original, de consideração muito necessária nestes tempos, do papel desenvolvido pela esquerda oficial nos acontecimentos posteriores ao 25 de Abril”.

Compreender o papel do PCP no pós-25 de Abril enquanto estabilizador do novo regime

“Produzir história política séria e rigorosa é impossível sem enfrentar a polémica, sem contrariar interesses e sem despertar críticas. Quando o tema é a política do PCP depois do 25 de Abril, um espantoso consenso uniu tanto os defensores do PCP quanto os seus mais irredutíveis adversários: a política do PCP teria sido a de um partido revolucionário em luta pelo socialismo. Este livro diz que essa interpretação é falsa e irá contrariá-los a todos. É assim que se deve escrever história. Merece, portanto, ser lido.”

A obra de Raquel Varela desafia o enigma sobre as posições do PCP entre a queda do V Governo Provisório, dirigido por Vasco Gonçalves, e o 25 de Novembro de 1975. Em páginas narradas de forma emocionante, a arte da investigação ajuda a levantar o pano que encobre o mistério e revela- nos que o posicionamento do PCP em defesa da estabilidade do novo regime, aceitando a dramática derrota da esquerda militar que indirectamente o enfraquecia também, assentava numa estratégia coerente desde o 25 de Abril. O mais interessante, e talvez assombroso, é que o PCP conseguiu cumprir este papel insubstituível e permanecer, no fundamental, intacto.

O génio político de Álvaro Cunhal

Álvaro Cunhal, cuja biografia foi analisada com muito detalhe por José Pacheco Pereira, desempenhou um papel único à frente de um aparelho monolítico como, possivelmente, nenhum outro partido estalinista europeu do pós-guerra: colaborar com a estabilização do regime democrático e, simultaneamente, preservar o PCP. Estas eram duas tarefas que pareciam incompatíveis e impossíveis de concluir com sucesso. Mas o facto de Cunhal ter atingido tais objectivos é a demonstração de um incontroverso génio político. Seria injusto não reconhecer o seu papel.

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Raquel Varela lança ‘Uma Revolução na Saúde’

Imagem: PCP+Bertrand Editora+Veríssimo Dias / ed VN

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