O café da manhã

 

 

Recentemente o chef internacional Gordon Ramsay veio a Portugal dar um ar da sua graça e, para gáudio dos portugueses, apresentou, entre outros, um requintado pequeno almoço típico português. À sombra de um chaparro, e utilizando como fonte de calor um braseiro, preparou uns ovos estrelados acompanhados com legumes salteados e carne de porco preto grelhada, que ele denomina por bacon. A notícia fez furor e deu azo a algumas crónicas em tom irónico porque, afinal, a refeição que nós fazemos pela manhã nada tem a ver com o que aquele chefe cozinhou. É que não basta ser chefe, é preciso conhecer os hábitos alimentares de uma região ou país.

Pois bem, esbocemos alguns rabiscos históricos sobre o assunto, numa história que está ainda por fazer. 

Recuo a Francisco Borges Henriques e ao seu livro de receitas e remédios, escrito nos inícios do século XVIII e trazido à luz pela editora Ficta em 2020. Nele, à fl. 208, quando nos ensina a fazer café, aquela bebida que na época começava a entrar na moda entre as elites, diz-nos  que o “café se toma pela manhaã de almosso em jejum sobre algũa couza com hũa fatia de pao com manteiga” e, mais adiante, acrescenta que  “o café com leite he só para as manhans e de noite tira o sono”.

Pela mesma época o dicionarista Raphael Bluteau diz-nos que o almoço é aquela refeição que se come pela manhã. E o mesmo nos vai dizer, nos finais do século, outro dicionarista, António de Morais Silva, referindo que é a “comida com que se quebra o jejum antes de jantar”. Entenda-se aqui que jantar é a refeição que nós hoje designamos por almoço.

Olhando estas informações percebemos que o nosso pequeno almoço, tal como hoje o conhecemos, se começou a definir nos inícios do século XVIII. Café simples, café com leite, pão com manteiga e, eventualmente, com doce, queijo ou requeijão. Um hábito que se foi consolidando nos séculos seguintes.

De tal forma se generalizou que as classes populares, que começavam o dia com uma tigela de sopa ou um caldo de unto, sem recursos para comprar café, aprenderam a fazer “café de cevada”, devidamente torrada e moída. E, se não houvesse manteiga, nem doce, comia-se o pão simples ou em sopas dentro do “café”. Em algumas regiões haveria com certeza requeijão e queijo, especialmente nas casas que o produziam. 

Além do café e da sopa, vigorava ainda o hábito, sobretudo entre os homens, de “matar o bicho”, ou seja, uma pequeníssima refeição forte e energética para ajudar o corpo a aguentar as primeiras horas da manhã. Dizia a minha mãe que o meu avô, a maior parte do ano, “matava o bicho” com um cálice de aguardente e um bom punhado de figos secos! 

Hoje, quando observamos as mesas de pequeno almoço dos hotéis e das novelas, para além do café e da manteiga, acrescenta-se a fruta, o sumo de laranja (às vezes fingido), o fiambre, os iogurtes, os bolos (croissants) e os “cereais”, aqueles flocos  inventados por americanos que se popularizaram no mundo ocidental ao longo do século passado. Ingredientes quase todos chegados à mesa portuguesa nos últimos cinquenta anos.

Fica, pois, claro que o pequeno-almoço de Gordon Ramsay não faz parte dos nossos hábitos quotidianos e, tal como nos disse Francisco Borges Henriques, no século XVIII, continuamos com o bom hábito de: “Um café por favor!”.  E já agora, venha também um pastel de nata!!

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Imagem: NLx

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