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É a noite doutor é a noite que dói
sim, pode revistar a distância que vai do meu interior ao benefício da dúvida
pode revistar que já nada tenho a esconder,
já nem a carteira levo
nem o instinto, que sempre carreguei ao ombro
em dias sem tempo
nem o taful do meu outro eu
que fugiu,
assim que viu a radiografia a provar
que ele também era culpado
Se dói quando inspiro?
Dói quando isto está desabitado por dentro, doutor
quando o sonho se parece aqueles aeroportos a uma segunda à noite
onde chegamos e partimos mas nunca ficamos
para contemplar os aviões
tanto avião doutor tanto avião
Ai ai doutor, claro que dói!
Aí: mesmo ao lado de onde um dia alguém irá perguntar: de quem era?
logo acima de onde em pequeno
só a minha Mãe chegava
Por favor não insista doutor,
entenda de uma vez por todas
que uma coisa é a dor doer para dentro
e outra é doer para fora
entenda… que uma é o método científico
e outra é chegar aqui com um Isso Não Deve Ser Nada
e sair com um É Assim a Vida
Eu acalmo-me eu acalmo-me doutor
mas não me pressione assim na noite dessa forma
como se estivesse à procura de um coração no caixote do lixo,
como se nos conhecêssemos desde pequeninos
como se eu já estivesse morto!
Eu estou morto, doutor? Ah?
Eu não estou morto
aqui quem manda ainda é o meu corpo veja! (mexeu na imagem)
foi ele quem hoje me arrastou até aqui
é ele quem continua a pagar as contas do sonambulismo precoce
é ele quem repõe a ordem,
quando eu quero ir para lá das órbitas da madrugada
Olhe que a cisma doutor
faz aumentar tudo ao que o corpo respeita
não venha agora dizer que é impressão minha
quando eu sei bem o que aí está escrito:
…………………………….ESTA VIDA E MAIS SEIS MESES
Mas eu aponto… aqui, na mão de todos os significados
não vá eu chegar a casa ainda vivo
e esquecer a razão do lado de fora da chuva
que está prevista para o final do ano
Ai doutor dê-me ouvidos de uma vez
é a noite é a noite que dói
**
Obs: Este poema foi originalmente publicado no livro Mecanismo de Emergência.
***
Andrew Thomas Huang, artista e cineasta, graduou-se em Belas Artes. A sua curta metragem Solipsist, de que um frame ilustra o poema de Tiago Alves Costa, foi vencedora do festival Slamdance de 2012 na categoria de filmes experimentais. Trata-se de “uma experiência visual única e cheia de contrastes, com cores que fazem os olhos saltar por tamanha beleza vista. Uma obra deslumbrante, magnífica e surreal”, assim se refere ao filme Ralyne no blogue O Coração de Alexandria.
Imagem: Solipsismo (screenshot) de Andrew Thomas Huang
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