josé ilídio torres - poesia - romance - escritor - professor - técnico de futebol - barcelos

E se o amor fosse uma pandemia?

 

 

Os tempos difíceis que vivemos têm mostrado um lado altruísta dos portugueses que andava adormecido, quiçá alienado.

Alienação parece-me aliás a palavra certa para descrever uma sociedade atordoada pelo consumo, pelo crédito, pelo umbigo.

Nestes dias de confinamento, em que ligamos definitivamente a ficha das tecnologias da informação e da comunicação, entram em nossa casa pela TV, pelas redes sociais, múltiplos exemplos de solidariedade, humanismo e forte responsabilidade social.

É certo que há também os inconscientes, os que acham que dá para dar umas “voltinhas”, apanhar um sol e “curtir” um passeio às grandes superfícies, mas cada vez menos, fruto também de medidas restritivas impostas pelas autoridades do estado.

Antes do vírus ameaçar a vida das pessoas, andávamos demasiado ocupados para pensar o que quer que fosse onde coubesse o outro.

Estou a exagerar? A generalizar? – sim estou, mas faço-o sem perder de vista aqueles que dão o melhor de si em todos os momentos da sua vida, para que os mais fragilizados, os mais desfavorecidos, possam sentir o conforto de uma refeição, de um cobertor, de um abraço, mesmo que agora não possa ser dado.

O estado, que devia proteger os seus, andava também ocupado em ser a alavanca da iniciativa privada, em viabilizar bancos falidos, em fundamentar políticas europeias duvidosas, sacrificando ao político o fundamental: o bem-estar dos cidadãos.

De repente toda a gente fala verdade, como se a mentira das políticas passadas tivesse sido apagada num lavar vigoroso de mãos entre dois parabéns a você.

Esta penitência, por mais bem intencionada que seja, deve ser fundamentada em políticas de largo alcance social, que protejam o emprego e as pequenas e médias empresas, responsáveis por uma enorme fatia do PIB.

As multinacionais vão sobreviver, e no pós-crise, vão estar em condições de potenciar os lucros, deslocalizando, reconvertendo a oferta, porque têm o background financeiro necessário, com interesses na própria banca, que, se querem saber, está-se marimbando para o «esquerdismo» momentâneo do líder da oposição – ela sabe que esta é uma oportunidade de ouro, como são todas aquelas surgidas do endividamento.

E pergunta o leitor, perante a aparente densidade desta dissertação: E que raio tem isto a ver com o título da crónica?

Tudo.

Sou daqueles inquietos que ainda acreditam que o amor é a alavanca de tudo o que a humanidade tem de positivo, apesar das guerras, da poluição, da xenofobia, do extremismo, da segregação, da ditadura do dinheiro e dos interesses.

Sou daqueles que acreditarão em pleno holocausto, que é possível renascer das cinzas, como a flor mais singela rasga a pedra, numa nesga de terra.

Sou daqueles que acha que o amor há-de sempre sobrepor-se ao ódio, o bem ao mal, por mais doloroso que possa ser o caminho.

Esta pandemia preocupa-me. Preocupa-me a perda de vidas, a dor das famílias, como me preocupam em igual medida aqueles que vão morrendo em vida dentro de nós, incapazes de lutar por um amor que não aquele nascido num take-away, num massajar permanente deste umbigo falso que alimentamos no baixo ventre.

A casa do amor é o coração, não tem portas nem janelas, e o tecto são as estrelas.

Saiba cada um acender a sua no firmamento.

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Michael Henry / Unsplash

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