Com poemas também se faz o Caminho. Com versos, com palavras oradas, com a declamação que o canto vai criando quando se dão os passos para nos acolhermos ao Campo da Estrela.
Com um concerto de vozes que também partem connosco e estão aqui presentes, a dar-nos sinal de partida.
Com Alberto Caeiro comecemos nossos passos:
Para além da curva da estrada
Talvez haja um poço, e talvez um castelo,
E talvez apenas a continuação da estrada.
Não sei nem pergunto.
Enquanto vou na estrada antes da curva
Só olho para a estrada antes da curva
Porque não posso ver senão a estrada antes da curva.
De nada me serviria estar olhando para outro lado
E para aquilo que não vejo.
Importemo-nos apenas com o lugar onde estamos,
Há beleza bastante em estar aqui e não noutra parte qualquer.
Se há alguém para além da curva da estrada,
Esses que se preocupem com o que há para além da curva da estrada.
Essa é que é a estrada para eles.
Se nós, que tivermos de chegar lá, quando lá chegarmos, saberemos.
Por ora só sabemos que lá não estamos.
Aqui há só a estrada antes da curva, e antes da curva
Há a estrada sem curva nenhuma.
in Poemas Inconjuntos
Agora, na estrada, tomemos Sophia de Mello Breyner Andresen por companhia:
SÃO TIAGO DE COMPOSTELA
(A D. António Ferreira Gomes,
Bispo do Porto)
A São Tiago não irei
Como turista. Irei
– se puder – como peregrino.
Tocarei a pedra e rezarei
Os padres-nossos da conta
Como um campesino.
Assim pudesse o poema
Ter doçura de trigo
Como a pedra esculpida
Do pórtico antigo
Ter em si próprio, a mesma
Compacta alegria,
Cereal claridade
Ante o voo da Ave.
Do Espírito se ergue
Os pilares da nave.
in Ilhas
E por aí vamos, agora com Alexandra Santos, pelo “Caminho”, como
Caminhante solitário
Entre a multidão,
Na Fé, na procura…
Às vezes, perdido,
Tantas outras esquecido,
Mas sempre firme,
Sempre convicto.
Com o Poeta brasileiro Murillo Mendes bem sabemos que
Santiago de Compostela (está) isolada no campo,
Mas na tua direcção marcha a Europa
Pesquisando, paralelos, Corpo e Estrela…
E na certeza enunciada, em galaico, pela também Poetisa brasileira Consuelo Cunha Campos,
Atopa-se o sepulcro indicado nas Estrelas
E vai xurdindo da morte a cibdá viva…
Entretanto, desenhamo-nos por cá, com Eduardo Aroso, com a sua “TOADA”:
No Minho
Há um caminho,
Um caminho que desliza
Em Portugal e Galiza.
Em Monção
Uma canção
Que se canta tal e qual
Na Galiza ou Portugal.
Por terras de Melgaço
É que eu levo um abraço:
Quero ser o portador
Com saudade e amor.
Em Ponte de Lima
Vejo mais acima
Estrela de poesia
Poema de Rosalía!
Pela Estrada continuamos, e com Eugénio de Ascensão, também fazemos o mesmo voto:
SANTIAGO
Quisera ver-te, numa manhã chuvosa,
Em que os vidros sentissem o carinho,
Da água deslizando, buliçosa,
Buscando atalhos, perdido o caminho…
Quisera ver-te, numa manhã chorosa,
As lágrimas do Céu, devagarinho,
A descer sobre a terra, sequiosa,
Sobre ti, Santiago, tão velhinho!…
Via Láctea que lá do Céu indicas
A estrada que conduz ao burgo antigo,
Leva-me lá, numa manhã assim!
Porque, como nos concerta Carmen Dessa, a verdade é que para os “CAMINHOS DE SANTIAGO”
“… percorrer,
Sobe monte, desce vale,
Na ânsia de chegar
Pra Santiago afagar e um pedido rogar,
Que a vida nos abraça com dor e ameaça,
Que a vida treme com amor e carinho
(quando) Santiago nos une à procura da Luz,
Em frente da Igreja do Padroeiro,
Naquele adro tão amplo,
Que alegria tão grande abraçar o Amigo!
Chegamos!
Aqui chegados, trazemos Pascoaes ao nosso encontro:
Galiza, terra irmã de Portugal,
Que a divina Saudade transfigura,
A tua alma é rosa matinal,
Onde uma lágrima de Deus fulgura.
Terra da nossa Infância virginal,
Altar de Rosalía e da Ternura!
Com poemas fizemo-nos ao Caminho. Tecemo-nos de palavras, renascemos com orações, dos cantos partiram a promessa e o Rosário de continuarmos vivos.
Restaurámo-nos.
Crescemos.
Habitámos os versos que fomos dizendo.
A que acrescentei estes com que, também, me fui escrevendo:
O CAMINHO
Move-se o coração
Pelo caminho das Estrelas,
Cresce de versos o caminho
Que vai dentro de nós,
E já não há dia ou noite
Que acompanhem
A sombra de nossos passos.
Vamos por nós,
Mas é para Vós, Senhor,
Que vamos.
Passo a passo
Nos andamos
No caminho que nos faz,
E quando chegarmos,
É a nós em Vós
Que chegamos.
Cantada por Teresa Salgueiro, com letra e música de Pedro Ayres de Magalhães, terminamos esta breve caminhada “NA ESTRADA DE SANTIAGO”, inserida no álbum “FALUAS DO TEJO” do Conjunto “MADREDEUS”.
Da letra cantada dá-se conta a seguir:
Carreiro
Deserto
Tão longe
E tão perto
Anseio
Secreto
Encontro
Mais perto
Caminha na estrada
De Santiago
A estrada marcada
Por tanto passo
Ao longo
Dos séculos
Passaram
Milhões
A vista
Cansada
De tantas paixões
Acorrem à estrada
De Santiago
A estrada marcada
Por tanto passo
E como
Se sente
Tão acompanhado
Se não vê
Mais gente
Nem tem ninguém
Ao lado
Caminha na estrada
De Santiago
A estrada marcada
Por tanto passo.
Este texto pretende ser um primeiro levantamento da poesia dedicada ao Caminho de Santiago em Portugal. Trata-se de uma investigação que se inicia no que se relaciona, sobretudo, como se disse, com a Poesia portuguesa. Mais composições haverá, certamente, e delas procuraremos dar nota em futuras intervenções, agradecendo todas as contribuições que tenham por bem dar-nos conhecimento.
Dos poemas apresentados nem sempre se deu a sua forma completa, de modo a preservar – discutivelmente, com certeza – a economia da comunicação.
A canção dos Madredeus –além do CD – poderá ouvir-se no youtube.
Obs: comunicação no V Congresso Internacional dos Caminhos de Santiago, realizado em S. Pedro de Rates, Póvoa de Varzim, em 16 e 17 de Novembro de 2018.
1ª Página. Clique aqui e veja tudo o que temos para lhe oferecer.
Imagem: Município da Póvoa de Varzim
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