Ilustrando a sexta faixa do terceiro álbum de Rodrigo Leão com os Vox Ensemble, Theatrum, Solitarium marca a segunda colaboração entre Manuel Mozos e Leão, depois de Um Passo, Outro Passo, e Depois… Falando sobre essa primeira experiência nas lides das bandas-sonoras numa entrevista a Henrique Claudino, o músico disse que “foi a partir daí que eu me apercebi que, a partir de um computador, tinha um universo ilimitado à frente, podia gravar um piano, depois um violoncelo, um violino… e foi aí que eu comecei a ter mais vontade de compor em casa, com auscultadores, computador, sintetizador. Na altura foi o Paulo Abelho, meu companheiro dos Sétima Legião, que me ajudou a descobrir esse mundo. Apesar de não ser um crânio, com o mínimo, consigo arranjar um método de trabalho e gravar as ideias. A partir daí fiquei com uma vontade grande de fazer mais música para cinema. Não foram tantos os momentos como este, tirando os últimos cinco ou seis anos em que comecei a trabalhar mais em bandas-sonoras.”
Em 2015, quando lhe perguntaram, aquela que deve ter sido a milionésima vez, se gostava da ideia de junção entre a realidade e a ficção, particularmente em Cinzas e Brasas, o realizador respondeu: “A mim agrada-me, não no sentido de querer brincar com as pessoas ou de estar a mentir descaradamente. Há, no entanto, uma intenção de tentar qualquer coisa que me parece divertida. O que realmente me interessa (…) é o [efeito] de criar isso no espectador, ou seja, o próprio ficar intrigado e ir, por ele, a posteriori, saber mais sobre as coisas, sobre as pessoas, sobre os factos, se existiram mesmo. Usando exemplos concretos destes dois filmes, se terão existido o cinema Louxor em Paris ou o realizador Roger Léon. Há coisas que são verdade, claro. Se a pessoa se interessar, se achar interessante o filme, pode ir por aí e tentar ter outro conhecimento. Essa será, digamos, a minha intenção maior. Posso não conseguir, obviamente, mas a possibilidade do espectador ficar intrigado e querer, realmente, aperceber-se do que é verdade ou falso dentro do filme, me anima. Não quer dizer que em todos os meus filmes isso seja sempre tão óbvio. No caso do Cinzas e Brasas tem a ver, como disse, com o primeiro romance da Dulce [Maria Cardoso], Campo de Sangue. Mas quanto aos argumentistas, no caso do Eduardo Brito, o autor do argumento do Glória de fazer cinema em Portugal, falei com ele, encontrámo-nos e a coisa foi-se desenvolvendo. Já com o Luís Lopes, o autor do argumento do Cinzas e Brasas, o argumento já estava escrito por ele, depois, adaptei-o em conversas e dizendo-lhe o que iria fazer, qual era a minha intenção em relação ao argumento que disponibilizava. Para ele, para o Luís, porque teve e tem uma relação muito particular com a Dulce, havia a intenção de não ser só um jogo com o primeiro romance da Dulce mas com a sua própria vivência e amizade com ela. Houve conversas com os três, não era uma coisa que a Dulce não soubesse ou que não estivesse de acordo. Foi uma espécie de brincadeira à volta do seu primeiro romance e dela própria. Obviamente que não se trata de um retrato da vida da Dulce.”
Já em 2016, Vera Bártolo escreveu para o Última Sessão: “Cinzas e Brasas (2015), uma curta de ficção filmada na aldeia dos Montes, concelho de Tomar, abriu as hostilidades e trouxe-nos uma história crua de uma vida marcada pelo alcançar de objectivos, pelo sucesso, que no fim não mais trouxe do que solidão, frieza e uma sobrevivência premente. É a história de Dulce, interpretada por Ana Ribeiro, na sua versão mais jovem e Isabel Ruth, na idade madura, uma escritora famosa para quem a vida foi um conquistar de metas, mas viveu esta mulher realmente, foi feliz? Não, e a Dulce madura é uma mulher marcada pela vida e solidão, a quem reaparece um homem do passado. E é entre cinzas e brasas que tudo culmina…”
A arrancar o ano da graça de 2020, o Lucky Star – Cineclube de Braga prossegue a sua retrospetiva dedicada a Manuel Mozos. Ao longo deste mês de janeiro, além das duas últimas longas-metragens de ficção que realizou, 4 Copas (2008) e Ramiro (2017), serão também exibidas curtas-metragens, documentários e videoclips seus. Solitarium (1996) e Cinzas e Brasas (2015) constituíram a primeira sessão da terceira fase do ciclo dedicado ao autor no cineclube na Casa do Professor de Braga.
Obs: Este texto foi previamente publicado na página do Lucky Star – Cineclube de Braga, tendo sofrido ligeiras adequações na presente edição.
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