Motivos para a indignação da classe docente

Motivos para a indignação da classe docente

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Os pais, que estiveram tantos anos calados, só agora abrem a boca e logo para se manifestarem contra a greve dos professores! A sociedade, que andava adormecida, quer, então, saber qual o motivo de indignação da classe docente?

A lista é longa, mas bastam apenas algumas perguntas – que não carecem de resposta – para deixar a descoberto a hipocrisia de uma população umbiguista.

Como pode uma sociedade viver de consciência tranquila quando existem professores a morrer em serviço com doenças terminais, em grande sofrimento, afastadas das suas famílias, porque sem lugar de mobilidade por doença, foram mandadas morrer longe?

Como ignoraram que professores tivessem de arrendar quartos, despensas ou até sofás e, alguns, tivessem mesmo de viver temporariamente nos seus carros para não dormirem ao relento?

Onde estavam, ao longo dos últimos anos, essas vozes de indignação contra estas condições que não as escutámos?

Um país que nunca se escandalizou com estas situações de falta de condições dignas – no meio de uma multidão que vive de extorquir os professores com rendas, gasolineiras e oficinas – está agora indignado, porque os professores entraram em ponto de rutura e estão a exigir “Respeito”!?

Onde estava toda essa gente para exigir que aqueles que educam os seus filhos tivessem o mínimo de dignidade?

Ao que parece, para muitos – que não compreendem o que é uma escola –, desde que aquele espaço estivesse de portas abertas, nada mais lhes interessava.

Mas os professores foram aguentando. Professores que morrerem na estrada sem nunca regressarem verdadeiramente a casa; que viram os filhos crescerem à distância; que criaram os filhos dos outros longe dos seus; que não suportaram e se arrastaram, com amargura, para fora do ensino; que foram aguentando ter cada vez menos reconhecimento financeiro; que estão a pagar um preço muito alto pelo simples crime de amarem o trabalho que abraçaram como profissão. Sim, profissão, pois os professores não são missionários, são gente, têm família e uma vida própria para além do trabalho.

Felizmente, uma parte da sociedade começa a tomar consciência do crime que tem sido cometido sobre esta classe profissional e, pela primeira vez, estão ao nosso lado nesta luta.

Hoje todos nós choramos um mar de lágrimas pelas duas professoras que este ano tiveram um fim de vida sofrido ao serviço, esquecidas pela sociedade e pelo governo, porque cada uma delas era uma de nós.

Clamamos por todos os colegas de profissão que morreram nas estradas ao longo de anos ao serviço de educar uma nação ingrata sem nunca terem conseguido regressar a suas casas.

Damos voz por todos aqueles que viveram sem o mínimo de dignidade e que, como única gratidão, tiveram de suportar todo o género de calúnias, mentiras e insultos de uma sociedade maniatada pelas máquinas partidárias e prosélitos que nunca tiveram a coragem de calçar os sapatos de professor.

Hoje lutamos pelo desejo de contribuirmos para que a Educação tenha mais qualidade, os professores sejam respeitados e os alunos possam vir a ter um futuro melhor.

Vimos sem medo, de mãos sem nada, mas cheios de razão no peito, pois havia muito tempo que todos nós sabíamos que isto estava destinado a acontecer.

Trago nas mãos as minhas gentes que me trazem pela mão e me dão esta força inexplicável.

Trouxe a algibeira cheia de palavras, de amarguras, sonhos e lágrimas, mas não consigo encontrar palavras suficientes para contar a nossa dor e nem preciso, pois neste momento são mais de cem mil vozes a dizer tudo aquilo que eu sinto.

Olhar para este oceano de companheiros de jornada é a alegria de ver os mesmos pensamentos em tantos sorrisos esboçados nos olhares molhados, em tantas vozes contando as mesmas histórias, cantando as mesmas angústias e esperanças e lançando ao vento os mesmos sonhos que nunca irão morrer.

É meu e vosso este sonho que nunca ninguém jamais conseguirá apagar.

É nossa esta luta que ninguém vai parar.

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Obs: texto previamente publicado na página facebook de Carlos Santos, tendo sofrido ligeiras adequações na presente edição.

Imagem: Pedro Costa

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Categorias: Crónica, Ensino

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