Nos últimos tempos, partiram para outros planos duas personalidades marcantes do percurso espiritual da humanidade nas últimas décadas. Estamos a falar de Rosamonde Ikshvàku Miller e de Thich Nhat Hanh.

Uma humanidade plural

A humanidade vive um momento especialmente relevante do seu percurso histórico. Vivemos uma humanidade eminentemente plural em todas as suas expressões socioculturais e religiosas. Por um lado, essa pluralidade é a manifestação da riqueza do espírito humano e de seus múltiplos valores. Cria condições para a ampliação dos horizontes da existência e uma vida mais abundante e plena

Por outro lado, esta pluralidade é desafiante, na medida em que implica segmentação na compreensão da realidade, das relações e das experiências.

Uma das expressões da pluralidade dos nossos tempos é a diversidade de correntes de espiritualidade, que emergem constantemente tanto no interior das tradições religiosas históricas como à sua margem. Uma são mais inclusivas e pluralista, enquanto outras são mais exclusivistas e dogmáticas.

De entre os seres que promoveram uma visão inclusiva e universalista da espiritualidade, mereceram destaque Rosamonde Ikshvàku Miller e de Thich Nhat Hahn.

Rosamonde Ikshvàku Miller

Rosamonde Ikshvàku Miller, que partiu dos planos terrenos em 31 de dezembro de 2021, foi uma mestre espiritual, mística e fundadora da Gnostic Sanctuary, sedada em Redwood City, no Estado da Califórnia, nos Estados Unidos da América.

De origem francesa, ela cresceu em várias culturas Em 1962, foi ordenada sacerdotisa e bispa no âmbito da Ordem de Maria Madalena, uma organização baseada na promoção do legado espiritual de Maria Madalena e de Jesus.

Frequentou várias universidades, incluindo a Universidade Católica de Louvain (Bélgica) e a Universidade de Havana (Cuba). Em Cuba, foi detida pelas autoridades cubanas, tendo sofrido maus tratos e torturas. No meio das sombras mais densas, Rosamonde não se somente perdoou aos agressores, como alcançou um estado de bem-aventurança.

Posteriormente, foi libertada e foi residir para os Estados Unidos da América, onde conheceu o seu esposo David Miller.

A sua liderança espiritual foi reconhecida pelos demais líderes gnósticos a nível internacional, tendo tido um papel de relevância na fomento do diálogo interespiritual.

Rosamonde baseou o seu trabalho na elevação da consciência humana, tendo como finalidade a experiência transformadora direta que surge numa mente tranquila, numa dimensão intocada pelo tempo cronológico e deixada indomável e incondicionada, livre de conceitos e imagens. Ela cunhou os termos “gnose selvagem” para descrever a experiência atrás mencionada, e “mística urbana”, para falar da capacidade de viver espiritualmente enquanto estamos inseridos no meio da vida em sociedade.

Thich Nhat Hanh

Thich Nhat Hanh, que faleceu em 22 de janeiro, foi o mestre budista contemporâneo mais prestigiado após o XIV Dalai Lama, Tenzin Gyatso.

Foi um ativista empenhado em prol da paz e dos direitos humanos. Foi proposto para o Prémio Nobel da Paz por Martin Luther King, que o apelidou de “apóstolo da paz e da não violência”.

O seu ensinamento-chave reside na crença de que, através da mindfulness, podemos viver em plenitude no momento presente, e que essa é, aliás, a única forma de desenvolvermos a paz, tanto em nós próprios no mundo.

Fundou seis mosteiros e dezenas de centros de prática de mindfulness em todo o mundo.

Thich Nhat Hanh tinha uma grande veneração por Sindhartha Gautama, o BudaJesus, e por Jesus, o Cristo, que representavam, na sua perspetiva dois modelos espirituais da maior relevância para a humanidade.

Thich Nhat Hanh formulou os conceitos de entre ser, que expressa a interdependência de todos os fenómenos, e do budismo comprometido como forma de aplicação dos conhecimentos da prática de meditação e dos ensinamentos budistas em geral a situações de sofrimento e injustiça social e ecológica.

Caminhos convergentes

Rosamonde Miller e Thich Nhat Hanh estavam ligados a duas linhagens espirituais diferentes, o gnosticismo e o budismo, mas partilhavam diversos aspetos comuns da maior relevância.

Em primeiro lugar, Rosamonde Miller e Thich Nhat Hanh partilhavam uma visão universalista da espiritualidade, uma das questões mais relevantes do nosso tempo. O universalismo espiritual é a reverência pela sabedoria presente nas cosmovisões religiosas e espirituais de todas as eras e culturas; E uma questão fundamental do nosso tempo., Não

é só um imperativo ético como um imperativo histórico. É um ideal partilhado por seres humanos de diversas crenças e culturas.

Em segundo lugar, preconizavam a identidade do divino e do humano, considerando que o autoconhecimento do ser humano é o conhecimento do Divino.

Em terceiro lugar, enfatizavam que os diversos mestres de sabedoria humana são guias que abrem o acesso à elevação da consciência.

Numa época na qual a Humanidade se confronta com tantos desafios, a espiritualidade do futuro será a espiritualidade que abra novos horizontes para a nossa mente e alargue a generosidade do nosso coração.

Uma espiritualidade que Rosamonde Miller e Thich Nhat Hanh defenderam e praticaram ao longo das duas vidas terrenas.

Ao longo das suas vidas terrenas, Rosamonde Miller e Thich Nhat Hanh manifestaram a riqueza da espiritualidade enquanto autêntica re-ligare, incentivando a conexão com a Realidade Primordial e Última, Fonte do Ser, da Vida e do Amor.

Uma espiritualidade que escutando o Dharma e expressando o Espírito, promove a transmutação do ser humano pela prática do amor incondicional, da compaixão, do altruísmo e do desapego.

Uma espiritualidade que transforma as relações dos seres humanos entre si, com a Natureza e com a Fonte originária de onde emana tudo o que existe.

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Imagens: DR

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