Quem vai mudar a forma como se nasce em Portugal?

 

 

Lembro-me de ser pequena e imaginar como seria o meu parto. Na minha mente sempre pairou aquela imagem tenebrosa dos filmes: deitada numa cama de barriga para cima, sem me poder mexer, com muita dor e obviamente com episiotomia (corte na vagina). Só de pensar neste quadro, o meu corpo tremia. Mas era assim que achava que seria o normal, o expectável…nunca pensei que pudesse ser diferente.

Como enfermeira e tendo bastante experiência em cuidados intensivos, sempre me fez sentido o controlo, a monitorização. Não considerava, por isso, a possibilidade de o nascimento ser diferente. Engravidei e um mundo completamente novo se abriu. Eu e o meu companheiro pesquisamos bastante, lemos muito… Foi a busca deste mundo tão amoroso da maternidade e paternidade que nos abriu novos horizontes. Descobri que podia ser diferente do que imaginava (ou sabia), que existiam outras opções. Afinal de contas, na nossa essência mais primitiva, mais mamífera, somos capazes de parir sozinhas, sem medicação, sem intervenção. Então porque duvidamos de nós, do nosso corpo, do nosso bebé?

Se recuarmos um pouco na história, num passado ainda recente, existia muita desigualdade em termos de condições higiénico-sanitárias em Portugal, de acessibilidade a vigilância e assistência na gravidez. Isso conduzia a elevadas taxas de mortalidade e morbilidade materna e infantil. Deste modo, surgiu a hospitalização do parto, de forma a promover uma maior segurança, vigilância e acompanhamento da gravidez e parto. Esta transição, obviamente contribuiu para a diminuição drástica da mortalidade e morbilidade materna e infantil, e também para uma maior acessibilidade a cuidados de saúde de qualidade. No entanto, estes mesmos cuidados obstétricos tão importantes, conduzem por vezes a uma excessiva medicalização e intervenção, num acontecimento que por si só devia de ser o mais natural e menos intervencionado possível: o parto.

Foi o medo da possibilidade de intervenções abusivas e toda aquela minha conceção pré-definida de parto que nos conduziu na busca de algo diferente. Para além de toda a pesquisa que fizemos, do acompanhamento que tivemos por uma Enfermeira Especialista em Saúde Materna e Obstétrica (parteira), das aulas de preparação para o parto e parentalidade, houve algo que mudou verdadeiramente a nossa forma de ver o parto e de direcionar os nossos esforços no sentido que queríamos: a participação em grupos de partilha, informais, de grávidas e mães e pais, sobre as suas experiências de gravidez, parto e pós-parto. Percebi o quão valiosos são encontros informais de partilha de experiências individuais, e que nos abriram a mente a um conjunto de novos caminhos, novas perspetivas. Sentimo-nos num ambiente seguro, livre de julgamentos, de respeito em que ouvimos e partilhamos informação, aprendemos com a experiência coletiva de outros casais e nos sentimos emocionalmente conectados naquele ambiente de construção.

Para a grande maioria dos casais, a gravidez e principalmente o parto são momentos que se revestem de uma grande ansiedade e medo. Nestes momentos de partilha, encontrar outros casais, outras mulheres, ouvir as suas experiências pode ser extremamente reconfortante, reduzindo o stress e desmistificando alguns mitos que envolvem todo este novo mundo do nascimento e maternidade. Estas partilhas potenciam o desenvolvimento de estratégias e ferramentas que ajudam a lidar com os desafios realistas da gravidez e parto e facilitam a transição para uma maternidade e paternidade mais consciente e responsável.

Deste modo, e querendo também dar o nosso contributo no percurso de outras mães e casais, surgiu o “Por Falar em Nascer…”. Trata-se de um movimento, criado pela Associação Portuguesa pelos Direitos da Mulher na Gravidez e Parto, em que mensalmente proporcionamos um momento de partilha informal, que acreditamos contribuir para o empoderamento das mulheres/casais, para a discussão saudável de opções conscientes e informadas e em última análise, para facilitar a vivência de experiências mais positivas e respeitadas daquela família que nasce. São encontros gratuitos, principalmente destinados a grávidas, amigos e familiares, mas também abertos a toda a comunidade. Acreditamos que este tipo de apoio social de igual para igual é extremamente benéfico… Somos Mães e Pais a ajudarem outras Mães e Pais, cada um de nós com a sua experiência, com a sua visão e com as suas emoções, num ambiente de compreensão. Pretendemos ser pontes de encorajamento e não barreiras, até porque sabemos o quanto impactante pode ser a opinião dos nossos pares.

Quem vai mudar a forma como se nasce em Portugal? Mães e Pais como nós!

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Imagem: Jonathan Borba/Unsplash

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