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No mês de maio, celebra-se o Dia da Mãe. Um dia especialmente dedicado a todas as mães deste planeta maravilhoso de aprendizagem chamado Terra.
É uma oportunidade privilegiada para refletir sobre a face maternal e feminina da Divindade, que deve ser recuperada, promovida e valorizada.
Quando se fala de Deus, é geralmente associada à sua imagem uma dimensão masculina. Mas esta imagem não tem fundamento sólido na história espiritual da humanidade.
Desde tempos imemoriais, a humanidade, na diversidade das suas culturas, tem tido uma perceção do Divino.
Durante dezenas de milhares de anos, os humanos viveram em harmonia com a Terra, sendo com ela uma mesma realidade inseparável. A Terra era experimentada, por aqueles seres humanos ditos “primitivos”, como um lugar cósmico ao qual todos pertenciam e ao qual nenhum grupo pretendia controlar ou dominar de modo exclusivo. Os humanos não sentiam a urgência de dominar o mundo. A Terra era entendida como organismo vivo e como a manifestação da Grande Divindade que era maioritariamente representada com traços femininos.
Contudo, com o desenvolvimento da agricultura, da criação de gado e das cidades, eclodiu a crise dos valores articulados em torno da figura da Grande Divindade e reforçou-se a vontade de poder, de domínio, de exploração da terra e dos seres humanos.
Na sua relação com o Divino, os seres humanos de todas as religiões adotaram uma linguagem influenciada pelas culturas dos tempos e dos lugares onde viveram.
A espiritualidade abraâmica, da qual emanaram o judaísmo, o cristianismo e o islão, não foi exceção.
Embora a Bíblia afirme categoricamente que Deus não é nem masculino nem feminino, os autores bíblicos não foram imunes à influência da sociedade patriarcal onde estavam inseridos.
Daí que a maior parte das referências bíblicas a Deus serem apresentadas com um rosto masculino. Os nomes de Deus mais mencionados na Bíblia são masculinos: Eloim, El, El-Chadai, Adonai.
Contudo, na Bíblia, existem referências à dimensão feminina de Deus, nomeadamente a Schekinah, a Presença de Deus, a Chokmah ou Sophia, a Sabedoria de Deus, e a Ruah, o Espírito de Deus.
Na kabbalah ou cabala judaica, que representa a dimensão mística e esotérica do judaísmo, Binah representa o princípio feminino de Deus, origem de tudo o que existe, sendo por isso considerada Mãe Natureza e Mente Divina. De acordo com a cabala, tudo o que existe é manifestação da Mente Divina. Este conceito também existe nas tradições mais exotéricas do judaísmo, onde a dimensão feminina de Deus é denominada Shekinah ou Ruah.
O triângulo superior da cabala é composto por Kheter, Chokmah e Binah. Segundo a cabala, a descida do raio da Criação divina obedece a esta sequência até chegar a Malkut, o universo manifesto.
A relação do universo manifesto com Deus, a origem de tudo quanto existe, dá-se pelo caminho inverso. De uma forma sucinta, não se alcança Kether, a Luz Divina Imanifesta geradora de todo o movimento da Criação, sem passar pela Mente Divina (Binah) e pela Consciência Divina (Chokmah).
O cristianismo primitivo, nomeadamente o cristianismo gnóstico, valorizou o legado da tradição mística e esotérica do judaísmo. Um legado que foi menosprezado posteriormente pela generalidade do cristianismo institucional, com consequências negativas para a humanidade.
Neste sentido, para os cristãos gnósticos, a mente de Deus é denominada Sofia, equivalente a Binah da cabala judaica, representando a Natureza e a Sabedoria.
O princípio masculino de Deus é o Cristo Cósmico, equivalente a Chokmah, representando a Consciência Divina, o Fogo e a Centelha.
Inseparáveis, Sofia e Cristo, Binah e Chokmah representam Mente e Consciência e são aspetos diversos da totalidade da Realidade Divina. Um não existe sem o outro.
Nas religiões orientais, a adoração da dimensão feminina do Divino está presente, apesar do peso de milénios de patriarcado.
No hinduísmo existe o culto de uma divindade feminina, superior a todos os outros seres divinos, segundo a qual há uma grande Divindade, chamada Shatki, que é a origem de tudo o que existe.
No budismo, uma religião não teísta, a dimensão feminina do Divino é reverenciada como a energia que nos nutre, cuida e cura, o que é manifestada em práticas como o culto a Kuan Yin.
Atualmente, uma das principais tendências espirituais é a revalorização da face feminina da Divindade, quer dentro das religiões já existentes, quer em novas formas de espiritualidade.
Um dos principais contributos das correntes feministas e das demais correntes que apelam a uma visão mais inclusiva sobre Deus consiste na relativização das fronteiras entre o divino e humano.
Estas correntes valorizam um processo progressivo de santificação e divinização de cada um de nos, através de um processo de transformação interior da nossa natureza, gerando uma nova existência espiritual.
A busca de uma nova compreensão sobre o Divino corresponde também a uma busca de uma nova visão sobre a relação entre o Divino e a humanidade.
Através da dimensão maternal e feminina do Divino, a Mãe Divina, denominada como Espírito Santo, Shakti e outras designações, que é a própria presença do poder infinitamente criativo de Deus, que é simultaneamente manifesto e oculto, a Criação surge e renova-se. Com efeito, falar da Criação divina em termos contemporâneos é reconhecer que o Divino atua como realidade infinita, primordial e criativa, simultaneamente transcendente e imanente, respeitando plenamente as leis da natureza, cuja origem é ele próprio.
Através da conexão com a dimensão maternal e feminina do Divino, a Mãe Divina, o ser humano pode superar o caminho da ilusão e trilhar o caminho autêntico de retorno à sua essência.
De um lado, a essência de que somos seres divinos, filhos do Altíssimo, segundo as palavras profundas de um dos maiores seres sábios da humanidade.
Por outro, a essência de que todos somos filhos do Divino e consequentemente mensageiros dos grandes valores universais no nosso mundo.
Assumir essa essência implica uma nova visão espiritual na qual todos os seres, mulheres e homens, humanos e não humanos, têm lugar.
Uma visão espiritual baseada na vivência de uma energia de amor ilimitado e de compaixão transcendental, tendo como referência a forma humana que é mais próxima do amor incondicional, que é o amor maternal.
A Sabedoria infinita da Mãe Divina circula, atua, torna-se vida, quando é acolhida, comunicada e transmitida. Ela é a nossa herança comum, de todos os seres humanos e não humanos, anúncio de um futuro que irrompe já no presente, que se torna força para a transformação individual e coletiva e abre o horizonte para um novo paradigma das relações dos seres humanos entre si, com a natureza e com a Fonte Divina da qual deriva tudo o que existe.
Imagem: Nicholas Roerich
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