Quatro poemas de visitação a Marrakesh

Jardim de Ménara

e devagar fomos chegando pelas ruas e múltiplas portas da cidade cor rosavelho

aromatizada de especiarias de incensos e véus inesperados

ao longe enquadrando o imenso jardim de oliveiras em verde musgo e manso as imensas montanhas do alto atlas cobertas de neve irrompem como por magia

no calor intenso em que olhamos a neve longe um lago se espalha longo tranquilo lento depois um pavilhão misterioso com tecto verde em forma de pirâmide aberturas em arcos pousados se abre para as cordilheiras de onde por labirintos subterrâneos vem a água

aqui em sossego alagoada

dizes-me que o sol queima. É verdade, tanto como aquela neve mais atrás

escondemo-nos sob a sombra das oliveiras e a sombra escalda ainda

aquele pavilhão seria o lugar perfeito

para nos teus lábios a água escorrer de desejo.

Fecho os olhos, em que lugar mágico caminha a sede satisfeita o calor da neve ao sol a tranquilidade dos espelhos de água reflectindo o encantamento de uma presença total?

Será que deus passeia por aqui ao final da tarde? olhando o fogo do sol na brancura alta das cordilheiras em radiosa brancura?

Minha alma estremece e dou-te a mão. Parece que encontrei um caminho

Uma brisa mínima sopra e as oliveiras gemem de prazer …toco os teus olhos e vejo um oásis lá dentro lá longe

à nossa frente

e nele tu e eu olhando estes jardins que nos olham este sereno lago que nos espelha e devolve

ao lugar em que a neve se iguala ao calor mais que perfeito.


A prova do chá de menta

Um pequeno bule de prata arredondado sobe nas mãos da jovem senhora de rosto enquadrado em lenço branco

escorre dele um aromático chá de menta açucarado para os pequenos copos

um prato de figos mel e canela um sorriso

em silêncio sorrindo de novo: a salamo a-leikom a paz esteja convosco!

A leikom es salâm agradecemos e provamos muito lentamente o chá misturado nas folhas verdes com cheiro a hortelã

o pequeno copo de vidro cinzelado aquece as mãos

pousamo-lo

e olhamos sorrindo aquele outro maravilhado sorriso adivinhação deleite de um para o outro

murmuro: dá-me a tua mão prova do meu chá descobre os meus segredos descobre os meus véus incensa-me de sonhos

prova-me

e sente o chá de menta sente como sou doce e perfumada as coxas arredondadas como as do bule

um sabor morno gostoso meloso escorregoso

perfuma-me de ti

habita-me

que eu provo contigo desde sempre um outro oriente em chá de gengibre maçanica moringa cravinho e cardamomo

intensos e antigos odores em geografia mais a sul Insha’Allah!


Os véus soltos da cidade antiga

Percorremos a pé as ruelas e estreitos labirintos da medina, que lembram outros nossos lugares

o comércio de porta em porta fervilha em animadas conversas as jilabas de muitas cores esvoaçam os véus adornam as cabeças das mulheres que passam

bicicletas motos atropelos vagarosos entre crianças que brincam nos pequenos pátios

os alfaiates e os barbeiros, os talhos, as cerâmicas, as pequenas tipografias, as prateleiras cheias de doces , as antigas mercearias onde se vende tudo, e os escaparates inúmeros misturados de vozes sobrepostas

soltos véus da medina aromatizados pelas bancas de especiarias, verde, negro amarelo, laranja vermelho, branco, os pequenos montes de pós incensados de cheiros maravilhosos

que se entrelaçam em outros e mais outros

em essências fortes, óleos e fragâncias, jasmim, rosa, aloendro, mirra, sândalo, cedro,bergamota canela, flor de laranjeira

pequenos e secretos vasos de vidro

que escorrem pelos poros da pele e a encantam que se entranham pelos labirintícos desejos do corpo e sedutoramente o enlaçam por entre estas pequenas artérias da cidade amuralhada

coração intenso e cativa fragância

em nossas diversas geografias e em nós dois reencontrada


Os caminhos do deserto

mais atrás ficou um longo deserto areias levantadas em anos e o vento despedindo-se das formas

imprecisão e lonjura seguindo as caravanas improváveis passo a passo e ano a ano o deserto permaneceu escondendo

um rosto sem idade

o azul do linho o resguarda das poeiras um rosto bronzeado pelo sol que desafia os caminhos e as monções

Uma rosa dos ventos na tua mão procura-me uma rosa de areia se desfaz por entre os dedos

Dizes: o achamento só é possível no cruzamento de acasos conjurados

Ou num céu sem nuvens…

talvez alguém tenha ouvido a tua voz caminhando rente ao deserto e rente ao mar índico

do outro lado do tempo, num outro mar e num outro continente

Aqui no deserto a geografia do amor é um estranho desenho que as areias e o vento as nuvens e a espuma

recomeçam sem cessar


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Imagem: AML

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