VN Online | Raias Poéticas - 7ª ed - 2018 | Ana Maria Oliveira

Raias Poéticas, 7ª ed – 2018 | A poesia, o poema, o poeta: interrrogação, rodopio, transformação

 

A poesia, no meu sentir, ondula como eterna interrogação, uma inquietação que tem de ser derramada, como um processo de transformação que alimenta, fortifica, mas que não deixa de ser sofrido. Algumas vezes, em agonia, exige expansão, rompimento, destruição e renovação. Um poema sobrevém no meio de uma agitação descomunal, perante o horror que pode ser a existência humana. É um processo de libertação de amarras, esquecendo o que nos incutiram e programaram, e avançar sozinho, porque a solidão é parte integrante do poeta. A distração das mímicas suga para longe deste sentir as multidões, o homem comum, trespassado por arquétipos controladores criados pela sociedade.

O poema rodopia em redor do ilimitado, do informe, sem norma, do inconstante, do movediço, em ligação com outros espaços de impermanência. Estoira num alargamento visionário que derruba muros castradores, sobe até onde os pássaros voam, instala-se até onde os deuses guerreiam, afunda-se na espeleologia até onde os vermes se escondem.

A poesia, como instrumento ou meio de acesso ao devir, ao dionisíaco, ao caos, sem normas, sem amarras, cria explosões únicas de criatividade.

A escrita do poeta torna-se inacessível e advém numa aridez em que as criaturas debandaram para o fácil, o circo apolíneo da estética que se escraviza a si própria e cria monstros que procuram incessantemente o mesmo alimento: Encher o ego! Não se expandem, não partilham, não se atrevem a ultrapassar fronteiras!

O poeta flutua na sua voz, dá o grito da revolta e liberta-se dos grilhões da sociedade. Esta será também a função do poeta! Derrubar muros, ultrapassar túneis, arrasar com os arames farpados com que mentes tacanhas se protegem! O poeta transforma-se assumindo um papel que é o de mudança, captando diferentes dimensões, de energias genuínas originadoras de vida e esquece as leis humanas que o sufocam, o maltratam, manipulam e assassinam. A linguagem humana tem estas características! Resta saber se o POETA se rebela contra esta linguagem e cria uma nova que a si mesma se renova eternamente. Não há morte para o POETA, apenas METAMORFOSE.

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Imagem de destaque: Ana Oliveira – Intervenção nas Raias Poéticas 2018 (José Lorvão; fotografia).

 

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