1.
A mente humana não descansa nunca, nem de noite, nem de dia, o que não faz de nós grandemente inteligentes. É muito senhora de si, a nossa mente. É anárquica de impresibilidade e intensidade. Pensamos que a controlamos, ou, ao menos, que a usamos quando e para o que queremos, mas não é bem assim. Talvez do seu uso sistemático tenhamos apenas a ilusão.
2.
Tem a nossa mente zonas brancas, que presidem aparentes ao nosso entendimento seu funcional, e tem zonas negras onde se esconde automática e não entramos. Não quer isto dizer que não funciona sempre. Mas funciona num caos de desperdício salutar e criador. É como um pântano imenso de margens imprecisas, e de profundidade desconhecida.
3.
Mesmo à superfície é anárquica. E é isso talvez que, trabalhando como quer, faça aflorar, com certa surpresa, para nós, pérolas de pensamento límpida mente concentrado, observações evidentes, mas que o não eram até surgirem, e demoraram imenso, e que não esperávamos, sentimentos que, num ápice nos inundam e de nós se apossam.
4.
Vivemos a pensar à deriva, embora na ilusão que não, e somos nós os donos do leme, senhores das coordenadas. Pensar por nós, no que queremos ou precisamos, ou o dever obriga, ocupa-nos intensamente, e cansa-nos. É evidente que podemos e devemos cultivar e cuidar do pensamento, ampliar a capacidade de atenção, concentrarmo-nos um certo tempo.
5.
Mas logo somos interrompidos, imperceptivelmente até, por qualquer coisa de nada. Uma abelha que passa, uma divagação, um adormecer longe noutro lugar ou tempo. É claro que acordamos, e logo retomamos a atenção e o dito pensar orientado ao leme. Mas já outra distracção espreita. E outra. E outra.
6.
Em que pensamos quando caminhamos? Que histórias começamos? Que desejos? Sabemos ao fim do dia onde estivemos e com quem ou só e o que fizemos, mas pouco, muito pouco mesmo, sabemos do que pensamos. Na verdade a fita do pensamento tem muitos espaços em branco. Talvez seja por isso que pensamos que pensamos todos juntos, e todos quase são unânimes quase em tudo, simplesmente porque não pensamos .
7.
Tão lamentável esta mesmidade do não pensar para além das margens do pensamento induzido, que nos irmana num pensar que pensamos tão elevadamente, e com todo o conhecimento aferido na ignorância, que aceitamos como verdade absoluta e sagrada. Eu, quanto a mim, sinto-me triste. Tão triste a teoria geral do unanimismo mental. E tão pobre.