VN Online | Deolinda Machado

Trabalho | 1º de Maio: Luta histórica que se afirma Hoje e no Futuro

Foi há 132 anos que, conscientes da falta de humanização no mundo do trabalho, centenas de milhares de operários de Chicago deram início a uma luta que se imortalizou em todo o mundo: o 1º de Maio!

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A evolução do conceito “trabalho”

De origem latina, a palavra “trabalho” começou por estar associada à ideia de tortura, de pena, de actividade que supõe um esforço penoso.

Com a evolução da sociedade este conceito alterou-se. A partir do século XVIII passa-se do trabalho-tortura, maldição, para o trabalho como actividade digna de reconhecimento social. O trabalho passa a ser olhado como meio de dignificação da pessoa, como fonte de realização pessoal e social. O nº 3 da Carta Encíclica “Laborem Exercens” do Papa João Paulo II refere que “o trabalho humano é uma chave, provavelmente a chave essencial de toda a questão social, se nós procurarmos vê-la verdadeiramente sob o ponto de vista do bem do homem”. E a solução da questão social assenta num princípio inviolável: “tornar a vida humana mais humana”.

Foi justamente há 132 anos que, conscientes da falta de humanização no mundo do trabalho, centenas de milhares de operários de Chicago deram início a uma luta que se imortalizou em todo o mundo: o 1º de Maio!

Na luta pela sua emancipação, por melhores condições de vida e de trabalho, denunciando a exploração a que estavam sujeitos, estes trabalhadores participaram na greve geral pela jornada de oito horas de trabalho, convocada pela Federação dos Trabalhadores dos Estados Unidos e Canadá. A violenta repressão patronal e policial provocou vários mortos, centenas de feridos e detidos. Oito, foram arbitrariamente condenados à morte.

Volvidos três anos deste massacre, em 1889, os Congressos de Paris declararam o 1º de Maio como Dia Internacional do Trabalhador, convocando para o ano seguinte uma grande manifestação internacional. O movimento operário e sindical internacional intensificou a sua organização, amplificou a sua acção e envolveu a sociedade numa luta que continua actual, pela valorização do trabalho e dos trabalhadores, pela defesa da Paz entre os povos, pela justiça social, pela liberdade, pela democracia e pela igualdade para todos.

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Valorizar o trabalho, dignificar os trabalhadores

Direitos e deveres são parte integrante do ser humano, acompanham-no ao longo de toda a sua existência. Mas o balanço histórico indicia que nem sempre tem havido total consciência disso, pelo que é necessário trabalhar, incessantemente, na elevação da consciência social e política dos cidadãos. A ética pessoal e profissional são valores imprescindíveis na vida, independentemente das funções e responsabilidades que cada um exerça na sociedade. Na linguagem de Paulo Freire temos de conscientizar, alfabetizar a comunidade para a humanização, elevar os padrões de dignidade da sociedade. Fazer da política a arte nobre de exercer a cidadania. Tomar posição. Em matéria de humanidade não há lugar para o neutro.

Há marcos históricos da luta emancipadora das mulheres e dos homens trabalhadores, dos povos contra a opressão, em defesa da liberdade e da democracia, que temos de continuar a lembrar, para que saibamos rejeitar as ditaduras fascistas, de mercado, do capital financeiro, ou outras.

A situação internacional é marcada, actualmente, por uma grande instabilidade, pelas guerras, pelas pilhagens de recursos, pelas abordagens xenófobas, discriminatórias, de ataque à liberdade de informação e de pluralismo, com acentuadas desigualdades, desemprego, migrações forçadas, exclusão social, fome, tráfico de seres humanos, onde organizações criminosas continuam, sem cessar, a multiplicar vítimas, perante a inoperância da comunidade internacional. Estas realidades têm de nos implicar, têm de mobilizar o melhor que cada um possui, em prol da comunidade humana. A solução política tem de ser encontrada!

Neste ano em que se comemoram os 70 anos da proclamação da Declaração Universal dos Direitos Humanos temos de levantar bem alto a bandeira da defesa da PAZ para todos os povos.

Em 2019 serão comemorados os 100 anos da Organização Internacional do Trabalho – OIT. Inscreve-se nos Direitos Humanos o direito ao trabalho, e através dele, o direito à realização pessoal e social de cada ser humano. A todo o momento somos confrontados com o desemprego, precariedade de famílias inteiras, a fome, a proliferação de baixos salários, pensões, reformas e prestações sociais, o aumento das rendas de casa, as dificuldades de acesso a cuidados médicos e aquisição de medicamentos, a emigração forçada dos filhos para garantir a sobrevivência. A pobreza viola os Direitos Humanos, pelo que urge erradicar as suas causas.

A democracia, a liberdade e a soberania são, entre outros, pilares constitutivos do Portugal de Abril. As eleições de Outubro de 2015 permitiram traçar um novo quadro político, reforçar a democracia, renovar a esperança, inaugurar uma nova fase de entendimento e de compromisso em defesa dos trabalhadores, do povo e do futuro do país.

Há que valorizar todo o processo de reposição de rendimentos e direitos, o que foi positivo para os trabalhadores e suas famílias. Valorizamos as medidas conducentes ao aumento dos salários, das pensões e dos apoios sociais, à devolução da sobretaxa do IRS, à restituição dos feriados, colocando fim ao trabalho gratuito de quatro dias por ano; a recuperação das 35H de trabalho para a função pública – cujo objectivo do governo anterior (do PSD/CDS) era embaratecer o trabalho e empobrecer o trabalhador, ao fixar as 40H de trabalho; foi revertida a entrega da gestão das empresas públicas de transportes rodo e ferroviárias a operadores privados; foi assumida a defesa da escola pública de qualidade e inclusiva com manuais escolares gratuitos no 1º ano, com introdução de alargamento a outros anos. Foi demonstrado, nestes últimos dois anos, que este é o caminho para assegurar crescimento económico, progresso social, desenvolvimento do país.

Apesar de alguns avanços conseguidos, perduram ainda no mundo do trabalho graves consequências das políticas de direita anteriormente praticadas. É inaceitável que cerca de 11% dos trabalhadores portugueses continuem a ser pobres, segundo dados do INE. É inaceitável que quem trabalha não consiga obter rendimentos que lhe confiram, a si e à sua família, uma vida digna. É inadmissível que se continuem a aceitar estas desigualdades como se de algo natural se tratasse.

Estamos numa nova fase, mas temos ainda um longo caminho a percorrer e, por isso, a luta terá de continuar. Ela é a prioridade de todos os dias para continuarmos a defender, a repor e a conquistar direitos para os trabalhadores e suas famílias.

É urgente concretizar a fixação das 35 horas semanais para os trabalhadores a quem ainda não foi aplicada esta medida, sem redução salarial e sem desregulação dos horários; a reposição de todos os direitos retirados; o aumento geral dos salários que se repercute numa melhor distribuição da riqueza; o aumento do salário mínimo nacional e das grelhas subsequentes; o fim do bloqueio na negociação da contratação colectiva, com a extinção da caducidade e a reintrodução do princípio do tratamento mais favorável, bem como a revogação de outras normas gravosas da legislação laboral, para os sectores público e privado; avançar na negociação do aumento dos salários, no sector público, para 2019, não misturando com o desbloqueamento das carreiras e das progressões. É que os salários abrangem todos os funcionários e as carreiras somente aqueles que atingiram determinada progressão num dado momento; pela melhoria do acesso aos serviços públicos e a garantia da universalidade na Saúde, na Educação, na Segurança Social, na Cultura e na Justiça; pela reposição dos 65 anos como idade legal de reforma e o acesso, sem penalização, após 40 anos de contribuições; fim ao flagelo da precariedade que contamina o mundo do trabalho e instabiliza a vida das famílias pela insegurança que provoca e pelas consequências na estabilidade dos vínculos familiares.

O mundo do trabalho continua com profundas injustiças, designadamente no que diz respeito ao rendimento que se destina aos salários.

Prossegue-se uma política de contenção salarial. Em Portugal, em 2015, as remunerações apenas representavam 1% nos custos na refinação do Petróleo, 4% na siderurgia, 8% no fabrico de veículos automóveis, entre outros, em que o peso da força de trabalho é inferior a 15% do total dos custos.

Os salários são mesmo muito baixos, no sector público e no sector privado; a precariedade é um flagelo que urge erradicar porque põe em causa o futuro dos jovens pela instabilidade e insegurança que provocam. Com a instabilidade dos vínculos laborais acentua-se o défice demográfico: não se pode dar resposta à baixa natalidade nem à fixação dos jovens investigadores, que corporizam a inovação e o desenvolvimento científico, comprometendo-se o futuro do país.

O trabalho digno assume particular relevância na sociedade em que vivemos. “Os direitos humanos são violados também (…) pela existência de extrema pobreza e estruturas económicas injustas, que originam as grandes desigualdades” –  alerta o Papa Francisco.

Que modelo de sociedade pretendemos construir? Uma sociedade que pugnando pelo bem comum dos seus cidadãos, investe na educação, na saúde, na realização da pessoa, através do trabalho digno? Então é uma sociedade que tem como objectivo comum a defesa da dignidade dos trabalhadores, a erradicação da pobreza e da precariedade, com salários justos, justas pensões de reforma, melhor distribuição da riqueza, emprego de qualidade, segurança, higiene e saúde no trabalho, habitação digna e igualdade de acesso aos bens sociais. Vamos continuar a lutar por isso.

Juntos somos mais fortes!

Pela valorização do trabalho e dos trabalhadores!

Por um Portugal com futuro! Viva o 1ºde Maio!

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