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Eleições autárquicas 2017: linhas de reflexão

 

 

Gostaria de começar pela seguinte nota: a principal diferença entre uma reflexão científica e uma reflexão social ou política prende-se com a impossibilidade de a segunda simular repetidamente experiências com a introdução de novas variáveis. Talvez seja esta diferença que nos faz acreditar que a ciência tem uma qualquer vantagem sobre as restantes áreas de estudo, fazendo-nos creditar mais do que o devido à linguagem científica. Não sendo possível, no domínio social, isolar acontecimentos, torna-se mais complexa a averiguação dos fatores que os causam e determinam os seus contornos. É a esse título, por exemplo, que o Partido Socialista nunca conseguirá provar que foi em resultado do seu governo que se obtiveram certos resultados económicos ou que eles nunca teriam acontecido sob o governo de Passos Coelho. E é desta impossibilidade de repetição (retirando, introduzindo ou isolando variáveis) que resulta a riqueza da política: tudo acaba por ser uma questão de disputa entre discursos no espaço público, que a cada momento é vencida por uma das partes.

Serve este ponto inicial para afirmar que não é possível determinar com clareza as razões que conduzem a um determinado resultado eleitoral – e no caso que aqui nos interessa: qual foi exatamente a razão que levou à vitória estrondosa do candidato da coligação PSD/PP em Famalicão, em sinal contrário ao que nos é revelado pelos mapas interativos e coloridos que ocupam os meios de comunicação nacionais? Nessa impossibilidade e acreditando que concorrem para os factos políticos vários fatores, a minha tentativa será a de que destacar aqueles que me parecem os mais relevantes.

O primeiro deles passa pelo reconhecimento de que os dados nos mostram que um presidente da câmara que se recandidata raramente perde a eleição. Isso pode acontecer em caso de conflito partidário interno (quando surgem duas candidaturas do mesmo espectro político) ou no caso de concorrer uma figura forte como Isaltino Morais (em condições, como sabemos, muito específicas). O fator-Gerigonça pode ter ainda provocado exceções a esta regra no que ao Partido Comunista diz respeito. Mas em situações normais, o projeto daquele que concorre contra um candidato que já está no poder – voltaremos a este aspeto no final do texto – é de elevada dificuldade e Paulo Cunha (PC) tinha este fator do seu lado.

Nesse sentido, uma candidatura que pretenda desafiar o candidato instalado tem um trabalho redobrado e que deve atender especialmente a dois aspetos: por um lado, tem de se tratar de um projeto preparado com tempo para que o candidato se possa dar a conhecer à comunidade (mais do que a filiação partidária, é o fator pessoal que constituiu o peso de ouro nas eleições para a autarquia). De preferência, deverá estar presente como vereador ou como membro da Assembleia Municipal por forma a apresentar uma oposição consolidada no tempo e nos argumentos. É igualmente necessária essa presença e apoio junto das próprias bases partidárias, numa relação de confiança e proximidade que permita consolidar a sua imagem. Em segundo lugar, deve conseguir apresentar, dentro de limites muito estritos, um projeto alternativo – voltaremos também a este aspeto no final do texto. Ora, no caso famalicense, o Partido Socialista não apresentou uma tal candidatura: não passando a questão tanto pelo mérito pessoal do candidato como pelas condições enunciadas, a candidatura do PS foi um fracasso.

Que outros fatores podemos apontar como tendo favorecido a reeleição de Paulo Cunha (PC)? O Presidente da Câmara beneficiou de uma transição de poder bem conseguida pela coligação em 2013 (a ter existido uma janela de oportunidade para mudança partidária teria sido aí – algo que também é revelado pelos melhores resultados do PS nessas eleições). Esse foi o momento crucial. Como referido, depois de se estar no poder, tudo se torna mais fácil. Para além disso, nos seus quatro anos de governação, PC não cometeu erros que pudessem pôr em causa a sua reeleição: não são públicos casos de má gestão, não criou situações de conflito conhecidas (tanto a nível interno e partidário, como externo) e ampliou a sua imagem como pessoa acessível e simpática (o tal fator ‘pessoal’ que é tão importante nesta dimensão eleitoral). São habitualmente apontadas duas críticas ao seu executivo: a primeira passa por considerar que durante esses quatro anos não se fez obra em Famalicão. E se a métrica for o betão, realmente o seu trabalho é praticamente inexistente. Várias obras (essencialmente relacionadas com o domínio desportivo – talvez a principal bandeira de PC) não chegaram efetivamente a avançar e a cidade em si não sofreu alterações de grande monta. A título pessoal, tal apresenta-se-me como uma vantagem: defendendo uma política de decrescimento sustentável, a não existência de obras é uma mais-valia e deveria representar uma nova forma de olharmos para a política. Não sei se esta é a visão pessoal que PC imprimiu ao seu projeto de governação (penso que as razões se prendem mais com questões económico-financeiras), mas no que diz respeito à dinamização de atividades não-betonais e de âmbito cultural, pouco faltou à cidade (deixarei o balanço das restantes freguesias para os seus habitantes). A segunda crítica passa pela dimensão propagandística do seu mandato e surge geralmente em sequência da crítica anterior: não tendo “feito obra”, PC conseguia ainda assim aparecer todas as semanas nos jornais, ao lado de empresas, fábricas, associações e iniciativas de cariz individual. Não tendo qualquer responsabilidade direta (e, na maior parte dos casos, nem sequer indireta) em qualquer destas iniciativas, a sua figura parecia, no entanto, omnipresente. Mas se esta sensação de omnipresença, criada propagandisticamente, parece dificilmente contestável, a verdade é que PC se limitou a aproveitar os meios que tinha à sua disposição – cabia à oposição desmontar o seu discurso.

E voltamos inevitavelmente à questão do poder: “estar no poder” revela-se então o principal fator concorrente para qualquer reeleição, revelando o lado lunar do sistema partidário e dos termos da democracia atual. Quem está no poder determina como e onde se gasta o dinheiro, criando redes de interesse, compadrio e dependência. E Famalicão parece sofrer de forma agravada deste problema na medida em que todas as iniciativas individuais parecem ter que passar pela Câmara Municipal e de obter o seu apoio, sob pena de não sobreviverem sem essa bênção. Com isso, as ligações de dívida e agradecimentos vão aumentando, numa situação especialmente gravosa no caso dos meios de comunicação locais. Esta situação é agravada pela condição que expusemos em texto anterior: embora os Presidentes de Câmara estejam limitados em número de mandatos, os membros da equipa de vereação não o estão, o que significa que vão prolongando o seu poder e perpetuando nichos de interesse e controlo nas suas áreas, junto de associações, empresas ou funcionários sob a sua alçada.

O problema é de PC e dos partidos da coligação? Não. O problema passa pela forma como o sistema autárquico está desenhado em Portugal. E é agravado pela pouca autonomia regional e local do país: na medida em que essa autonomia é muito diminuta, um projeto político tem limites muito estritos para se implementar. E isto, por sua vez, torna extremamente difícil apresentar propostas alternativas de governação. Não admira, por isso, que os programas políticos se assemelhem e que o fundamento eleitoral recaia no fator pessoal do candidato. Se é verdade que a política tem sempre uma dimensão pessoal e muitas vezes pareça que “todos dizem o mesmo”, ainda assim é possível a nível nacional termos discursos tão distintos como o de Passos Coelho desde 2011 e o de António Costa desde 2015 (se a política efetiva é assim tão diferente é um outro assunto). Já no âmbito local isso é quase uma impossibilidade – ajudando a perpetuar a regra que autoriza a preponderância da reeleição, tal como aconteceu em Famalicão mesmo em sentido contrário ao movimento que se tem vindo a registar no resto do país desde 2013.

(Devo um agradecimento especial a todos aqueles que se dispuseram a partilhar as suas opiniões, de acordo com o espírito de que a reflexão política nunca se faz a uma voz, mas sempre pela máxima reunião possível de diferentes perspetivas.)

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