Covid-19 | A pandemia e a nossa democracia, ou responsabilidade versus liberdade

 

 

Um passeio noturno pelas nossas cidades numa noite deste fim-de-semana, em que estamos assolados pela pandemia da Covid-19, revelaria – como pude confirmar em Braga – grupos de jovens em alegre convivência, apesar de todas as medidas tomadas a nível nacional (e internacional) para limitar o convívio social com vista a evitar a propagação da doença. Tal aconteceu (e infelizmente ainda acontece) também em Itália ou Espanha, só para citar os exemplos mais recentes e graves. Poderíamos alegar a irresponsabilidade própria da idade, mas infelizmente outros exemplos, como a enchente nos bares do Cais do Sodré ou nas praias por todo o país, revelam que o problema não se restringe à irrequietude natural da juventude … mas porventura se alarga à geração dos seus progenitores.

E inevitavelmente surge como natural a seguinte questão: será que estes cidadãos não se apercebem das consequências das suas ações, quer no risco em que se colocam si próprios, quer nos perigos que impõem a toda a sociedade?

A pandemia que vivemos traz às nossas sociedades democráticas ocidentais um problema único. De facto, já tínhamos que lidar com questões desafiantes como o terrorismo e a sustentabilidade perante as alterações climáticas, mas a pandemia provocada pelo coronavírus SARS-CoV-2 tem características que a tornam num desafio singular, a enfrentar por todas (ou a esmagadora maioria) das sociedades quer as mais democráticas, quer aquelas que acreditamos para aí estão a caminhar. E nada seria mais trágico que deste desafio adviesse a incapacidades das primeiras em lidar com o problema…

Infelizmente, os problemas sentidos atualmente pela Itália e pela Espanha, em contraponto com o que parece ter sido uma estratégia de sucesso na China, apesar do seu caráter radical, parecem ir neste sentido. Muitos têm referido que uma estratégia deste género seria impossível num regime democrático … mas o certo é que o resultado final parece ter sido positivo. Claro que todos questionamos qual o preço a pagar em termos dos direitos dos cidadãos… até pelas limitações impostas nos direitos individuais (o governo chinês parece neste momento ser capaz de conhecer a localização de todos os seus cidadãos …).
Uma sociedade rege-se por regras e todos sabemos que, mesmo em democracia, a liberdade de cada um acaba onde começa a liberdade do outro, i.e. a liberdade individual tem os seus limites se queremos viver em sociedade. Ainda assim, numa democracia moderna espera-se que nem todas as regras sociais tenham que ser impostas por coação, mas antes que os cidadãos possam perceber os limites da sua liberdade e seguir princípios de cidadania partilhados. Se tal não acontecer, dificilmente um regime democrático pode sobreviver apenas baseado em leis que definem regras que alguém (agentes de autoridade) teria que impor … ainda que estes sejam necessários em alguns casos. Talvez estejamos a falhar na nossa missão de mostrar aos nossos jovens a necessidade de comportamentos responsáveis e as consequências de alguns atos.

O desafio que se nos coloca é sermos capazes de, como sociedades democráticas, enfrentar estes problemas sem pormos em causa os nossos princípios basilares. Isto só será possível se nos convencermos que, para manter um regime democrático, é necessário que os cidadãos demonstrem responsabilidade, que percebam os limites da sua liberdade e que cumpram as regras básicas para o funcionamento da sociedade. Caso contrário, entraremos num regime baseado em repressão que pouco se distanciará de regimes ditatoriais. Neste caso, estaremos a regredir na nossa história e a promover os movimentos menos democráticos que infelizmente grassam no seio das nossas democracias.

Quero acreditar que não seguiremos por aí (e exemplos como as palmas às 22 horas por todo o país são reconfortantes) … mas tenhamos consciência que a democracia não é um direito adquirido e implica uma luta constante onde todos temos um papel relevante!

 

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