Governança | Para inglês ver

 

 

De acordo com Michel de Certeau, uma forma de conhecer a cidade seria caminhar por ela. Por analogia, um das melhores formas de conhecer a Universidade é deambulando por ela (pelos seus edifícios, entenda-se). O tempo livre aparentemente escasso há duas semanas atrás surgiu recentemente, proporcionando uma oportunidade para esta vadiagem.

A fachada do Departamento de Bioquímica parece restaurada, branca como cal. O seu interior não parece destoar, com o hall e as escadas que sobem para o Museu da Ciência em perfeitas condições.

Contudo, o corredor à direita, apenas percorrido por alunos, professores, funcionários e restantes sujeitos do mundo académico, começa a destoar deste panorama exemplar. Longe da curiosidade dos turistas, as paredes mantêm-se gastas pela humidade. Os pátios interiores mantêm-se maltratados e deitados ao abandono, como se estudantes, docentes e funcionários não merecessem igualmente um espaço acolhedor.

Este é um dos retratos do paíspara inglês ver”, como dizia o Regente Feijó. O país cujos governantes fazem tudo para agradar aos turistas em detrimento dos seus próprios cidadãos. O país cuja capital é um parque de diversões para os visitantes, parque de diversões esse cada vez mais hostil e inacessível para os seus moradores. O país cuja capital é presidida por um homem ajoelhado perante os devaneios abusadores de uma diva da pop. O país cujos líderes da sua segunda maior cidade celebram o aspecto pitoresco e pseudo-cosmopolita daquele espaço, o mesmo espaço onde os estudantes universitários não conseguem alojamento e onde todas as zonas para além da Foz e do centro são ignoradas. O país cujo interior é tratado como uma mera paisagem para o deleite dos visitantes endinheirados.

Vivemos num estado de aparências, onde uma elite inteira acha mais importante parecer do que ser. O complexo de inferioridade que domina esta sociedade cria uma necessidade de aprovação por estrangeiros. Afinal, a galinha da minha vizinha é sempre melhor que a minha.

Devo esclarecer que não considero as influências externas negativas. Devemos aprender com “o outro”. Devemos conhecer a cultura e o modo de vida do outro e dar-lhe a conhecer a nossa (em boa verdade, deveríamos dizer “as nossas”). Da mesma forma, quem quiser entrar é bem-vindo.  O problema reside na necessidade de agradar a quem apenas nos visita. Ser um bom anfitrião não significa ignorar quem não está apenas de visita. Ser um bom anfitrião não significa ignorar os locais por onde os visitantes não passam.

A capacidade de preocupação e de cuidado não é finita. Não é mau ver as elites preocupadas com os turistas e com a imprensa internacional, mas talvez seja a hora, de uma vez por todas, de também se preocuparem com quem cá vive (e com quem também fala sobre eles cá dentro).

 

Imagem: Henrique Macedo

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