‘Data e local de nascimento de D. Afonso Henriques, de Narciso Machado’ – Prefácio

 

 

Nos anos 70 do séc. XX e na Faculdade de Letras da Universidade do Porto, os Professores Humberto Baquero Moreno, Catedrático responsável pela Cadeira de História Medieval de Portugal e José Marques, Assistente, apresentaram aos alunos a Unidade de Ensino “Como nasceu Portugal”, indicando, como apoio, entre outros, Damião Peres na 7ª Revista, onde estavam assinaladas cinco teses, cada uma defendida por diferentes historiadores. Mas, especificamente, os alunos tinham de procurar explicar porque geograficamente o reino assumiu a forma rectangular, quando fora oriundo do Condado Portucalense que teve a forma quadrangular, e o reino de Leão a mesma forma. Cada aluno escolhia uma tese, estudava-a e, no exame da cadeira, quer escrito ou oral, tinha de a defender. O autor deste prefácio fora um dos alunos que igualmente teve de optar por uma das teses. Não se recorda qual, mas lembra-se que a nota não foi baixa.

Ora este assunto não foi estudado com profundidade, durante muitos anos, porque cada historiador emitia a sua opinião sobre o lugar e nascimento de D. Afonso Henriques.

Afonso Henriques – teses várias sobre o nascimento

Assim, em 1990, houve uma publicação no Dicionário Enciclopédico de História de Portugal, das Selecções, de Hermano Saraiva, sobre Coimbra, como local do nascimento.

Porém, decorrido pouco tempo e num segundo escrito, refere Guimarães. Outro historiador e Professor Catedrático de História da Universidade de Coimbra, Torcato de Sousa Soares diz que nasceu em Coimbra.

Historiador de Viseu, Dr. Armando de Almeida Fernandes, afirmou ter sido Viseu e em Agosto de 1109. E, em Setembro de 2009, na cidade de Viseu, alguns defensores da tese do Dr. Almeida Fernandes promoveram um Congresso lnternacional para comemorar os 900 anos do nascimento de D. Afonso Henriques.

E o empolamento foi de tal ordem que se propôs no Congresso ser pedido a Academia Portuguesa de História para que fosse colocado nos Compêndios de História de Portugal, na Unidade de Ensino sobre a Fundação do Reino de Portugal, que D. Afonso Henriques nascera em Viseu, e em Agosto de 1109.

O pedido não foi despachado favoravelmente. Ainda bem.

Este caso e outros similares são uma prova de que a Historiografia nem sempre tem andado por bons caminhos.

A hipótese do nascimento em Guimarães

Nesta indefinição, surge um defensor por Guimarães e no ano de 2008. Foi o Juiz e Desembargador Dr. Narciso Marques Machado que editou um livro intitulado “Guimarães — Da Fundação de Portugal à lntegração Europeia” onde refere que foi em Guimarães que o Conde D. Henrique e D. Teresa – [agora dita a 1ª rainha de Portugal] – fixaram residência, em razão de por lá passar a via romana, a qual facilitava a comunicação com os pontos importantes do norte do Condado, por dar garantia e mais segurança ao governo porque havia um castelo que recebeu uma traça diferente do castelo rouqueiro, do tempo da Mumadona.

E Duarte Galvão, escrevera o seguinte texto que diz: “Quando Egas Moniz soube que a rainha parira, cavalgou à pressa e veio-se a Guimarães onde o Conde estava e pediu-Ihe por mercê que lhe desse o filho que nascera para o haver de criar como lhe tinha prometido. E o Conde e D. Teresa doaram em Guimarães um campo a franceses que viviam lá pelos serviços prestados na causa da Reconquista e o próprio documento dessa doação tem uma frase que dita a residência desses franceses junto do palácio do casal: “Palatium nostrum regaIe nosso palácio real.

Mas, com toda a verdade, não se pode afirmar que D. Afonso Henriques nasceu num espaço aéreo, dentro de um avião, ou numa maternidade, porque nesse tempo não havia maternidades, nem aviões. Nasceu na casa onde viviam os pais e essa fora o palácio em Guimarães.

Porém, o livro do Dr. Narciso Machado, que também tratou do nascimento do D. Afonso Henriques, não teve o desenvolvimento que fora planificado, isto é, que queria desenvolver, porque em 2009 houve um congresso, precisamente sobre o mesmo assunto e necessitava de mais tempo para apresentar uma contradltória ao que foi lá tratado. Por isso, com toda a coragem e equipado com a cultura de que é senhor, põe-se ao caminho. E, num espírito de pertinácia, lança-se ao trabalho que está prestes a ser editado, mas com mais amplitude, pedindo-me para que fosse eu o responsável pelo prefácio.

Aceitei o pedido pela importância do Iivro, pela carga didáctica e ter eu a honra de colocar o nome numa das páginas.

Nesse sentido vou procurar apresentar uma intervenção simples, clara, objectiva e até extrapolada.

E o Dr. Narciso Machado, depois de já ter tratado o assunto que dizia respelto ao “Onde”, vai contemplar o “Quando”, sobre o qual também não há uniformidade nos historiadores, mas apenas opiniões, uma adossada à certeza, quando ela não existe.

O assunto, em causa, circunscreve-se numa margem de tempo multo longínqua, séc. XII, em relação à margem actual e os historiadores não dispõem de condições, documentos em absoluto por definição, para observar os factos que procuram encontrar. Seria até muito fácil se houvesse registos de nascimento. Mas não há.

Porque até nenhum especialista das Guerras Napoleónicas ouviu o tiro do canhão de Austerlilz da época que nos precedeu e o estudo em trabalho, nascimento de D. Afonso Henriques, mantém-se aos humanos que não o viveram, nem conheceram.

Mas, o Dr. Narciso Machado possui capacidades que outros historiadores não possuem. É o conhecimento do Latim, Direito Antigo, Paleografia. Latim, porque os documentos estão escritos em latim, até D. Dinis, e com uma grafia que apresenta os caracteres paleografados. Direito Antigo, por causa dos costumes, forais e doações, com os seus dizeres nos documentos. Paleografia escrita antiga. Tem equipamento intelectual, vantagens demonstradas em multas obras de sua autoria, todas de investigação científica, multos trabalhos jurídicos produzidos no âmbito do exercício da sua actividade profissional, juiz desembargador, produzidos na Colectânea de Jurisprudéncia, ed. Da Associação Sindical dos Juízes Portugueses e Crónicas publicadas nos jornais Iocais, Diário do Minho e Público.

E é de lembrar que basta um erro de uma palavra ou vírgula fora do lugar, para falsear um documento.

E postos estes considerandos, passava, então a dizer o que se espera dos historiadores nesta fase. Não certezas.

E, para dar seguimento ao item anunciado sobre a data do nascimento de D. Afonso Henriques, começava por apresentar a opinião do Dr. Armando de Almeida Fernandes que, fundamentado nas Chronica Gothorum do volume Scriptores et Chartae da obra Portugaliae Monumenta Historica, afirmando que D. Afonso Henriques nascera em 1109. Mas vai buscar à obra referida um texto sobre a morte do Conde D. Henrique para suporte da sua afirmação. O texto é o seguinte:

Siquidem mortuo patre suo domine henrice cum adhuc ipse puer esset duorum aut trium annorum.

O referido Dr. Almeida Fernandes, para vingar os 1109, vai traduzir o <<aut>> por <<para>>, para depois dizer que o próprio menino teria a idade de dois para três anos. E, assim sendo, o D. Afonso Henriques nasceria em 1109.

Mas a questão é outra, porque houve um erro voluntário na tradução, quando o <<aut>> latino é uma conjunção disjuntiva e o <<para>> é uma preposição. Logo a tradução está errada e o sentido é outro. Então, a passagem para a língua materna é: Porquanto, morto o seu pai, senhor Conde Henrique, o próprio menino seria de dois ou três anos.

Esta é a tradução correcta dada pelo Dr. Narciso Machado, porque atendeu à gramática da frase, dando o verdadeiro significado às suas palavras.

Rui Pinto de Azevedo in Doc. Medievais Portuguesas LV fundamentado nas fontes diplomáticas diz que o Conde D. Henrique morreu nos fins de Abril de 1112. Mas o Dr. Narciso Machado esteve atento à manobra da preposição e não deixou passar. Mas há mais opiniões:

Há a data de 1111, mas sem dignificado, porque tem poucos seguidores e o seu autor não tinha fundamentos sérios.

1106. Esta datação teve como fonte um manuscrito do séc. XII, encontrado na Câmara Municipal do Porto pelo medievalista Abel Estefânio, a qual teve muitos seguidores.

Refere a vida de S. Teotónio, que morrera em 1162, quando D. Afonso Henriques tinha 56 anos. Ora, se efectivamente a morte de S. Teotónio ocorreu em 1162 e que nessa mesma data o D. Afonso Henriques tinha 56 anos, poder-se-á concluir que D. Afonso Henriques nasceu em 1106.

O Dr. José Matoso aceita de bom grado, essa afirmação, como se prova pelo que foi dito por si mesmo: O estudo é um exercício textual de fontes contraditórias e não sobre testemunhos tardios, nem sobre tradições seculares, estabelecendo o testemunho de que, em História não há soluções baseadas no argumento da “autoridade”.

O Dr. Narciso Machado discorda da data de 1109, da autoria do Dr. Almeida Fernandes, porque não está fundamentada e assume a data do Investigador Abel Estefânio.

Pelo que consta na obra do Dr. Narciso Machado posso afirmar, sem margem para erro, que não necessita de fazer mais pesquisas, gastar mais tinta, mais papel, porque já disse tudo sobre quando nasceu e onde nasceu o nosso primeiro rei, Afonso Henriques.

Parabéns e Bem Haja pela obra, que é mais uma na sua colecção para o Mecenato. Mas a Cultura saberá pagar-lhe.

Um vivo e sincero testemunho da mais alta Estima e Consideração.

Imagens: (0) Escultura de D. Afonso Henriques – detalhe (Universal Rocks; divulgação), (1) D. Afonso Henriques representado no Compendio de crónicas de reyes (Biblioteca Nacional de España; divulgação).

Hiperligações:

Narciso Machado: data e local de nascimento de D. Afonso Henriques

**

*

Se chegou até aqui é porque provavelmente aprecia o trabalho que estamos a desenvolver.

A VILA NOVA é cidadania e serviço público.

Diário digital generalista de âmbito regional, a Vila Nova é gratuita para os leitores e sempre será.

No entanto, a VILA NOVA tem custos, entre os quais se podem referir, de forma não exclusiva, a manutenção e renovação de equipamento, despesas de representação, transportes e telecomunicações, alojamento de páginas na rede, taxas específicas da atividade.

Para lá disso, a VILA NOVA pretende pretende produzir e distribuir cada vez mais e melhor informação, com independência e com a diversidade de opiniões própria de uma sociedade aberta.

Se considera válido o trabalho realizado, não deixe de efetuar o seu simbólico contributo sob a forma de donativo através de netbanking ou multibanco. Se é uma empresa ou instituição, o seu contributo pode também ter a forma de publicidade.

NiB: 0065 0922 00017890002 91

IBAN: PT 50 0065 0922 00017890002 91

BIC/SWIFT: BESZ PT PL

Obrigado pelo seu apoio e colaboração.

*

Deixe um comentário