O homem e a Cidade

O Homem, a partir do momento que teve de responder às suas necessidades primárias de abrigo e adaptação ao meio, através dos sentidos, enquanto receptores sensoriais, retirou das sensações do ambiente as informações necessárias para a construção da sua percepção do espaço, respondendo, através das suas experiências emocionais, com a criação do seu abrigo em lugares e cidades.

Espacializou, assim, o mundo através de um processo de acção-reacção sensorial e emocional, que variou em função de factores de ordem climática, geográfica, topográfica e sócio-cultural, numa relação de interdependência tal cuja separação não parecia ser possível.

A cidade (clássica) resultou da sua história por acção directa de todos os que nela participaram, o que, de uma forma mais ou menos colectiva, conduziu a um desenvolvimento económico-social que se reflectiu no seu tecido urbano, determinando caraterísticas em função das diferentes culturas.

Esse processo foi-se alterando ao longo da sua história e aconteceu sempre que o homem sentiu necessidade de se (re)organizar socialmente, por exemplo, no período da Revolução Industrial ou na chamada Era da Globalização, com o aparecimento das novas tecnologias que nos conduziram ao mundo digital, o mundo da hiperconectividade, dando lugar às maiores transformações do nosso tempo.

O ritmo que a vida das pessoas atingiu, quer pela estimulação das tecnologias de informação e de comunicação, cujo acesso se democratizou, quer pelo mundo da competição profissional em que vivemos, cada vez mais exigente, provocou o distanciamento físico e emocional entre as pessoas e, por consequência, o afastamento da cidade.

Com a propagação das redes sociais, as pessoas passaram a ter um acesso facilitado entre elas, embora de uma forma remota, criando-se uma espécie de neo-sedentarismo que as acomoda na sua zona de conforto, originando de certa maneira o afastamento dos indivíduos da vivência urbana, acentuando-se ainda mais nos meios culturalmente pouco atractivos, por falta de equipamentos ou de qualidade da programação ou da divulgação dos seus eventos.

Mas se é verdade que a sociedade em geral está mais fechada em relação ao meio onde se insere, não deixa de ser sintomático constatar um factor essencial para nós, que defendemos uma ideia de universalidade, o facto de ao mesmo tempo verificarmos uma certa convergência entre as diferentes culturas, hoje mais próximas nos hábitos e costumes que, de há alguns anos a esta parte, eram impensáveis. Para esta aproximação, o mundo da hiperconectividade contribuiu decisivamente.

Numa perspectiva mais optimista do que aquela que os meios de comunicação normalmente fazem passar, refira-se que o processo de globalização ainda está a acontecer. É um processo em contínua construção, que tem ainda um longo caminho a percorrer ao encontro da sua verdadeira mundialização.

O desenvolvimento económico é inevitavelmente necessário, tanto pela agilização e optimização dos meios, como dos recursos naturais, mas a forma insustentável como tem sido gerido, deixou a sociedade, em geral, numa situação muito difícil, influenciando determinantemente a vivência do homem com o meio, numa teia que parece incontrolável e que deriva de um sistema em crise que provocou um decréscimo da nossa felicidade e consequente perda de esperança.

Importa salientar os importantes esforços, em que têm sido agilizados processos urbanísticos e estratégias de desenvolvimento que resolveram muitos dos problemas do passado que se prendiam com a falta de infra-estruturas básicas e de mobilidade. Apesar de ser conhecido o impacto da crise conjuntural, para muitos, de ordem estrutural, ficaram minimizados, pela forma como foram ultrapassados, muitos dos problemas de outrora pelos níveis de qualidade de vida conseguidos, como mostram os exemplos de Lisboa, Porto ou Braga.

Os recentes conceitos para a criação das chamadas cidades inteligentes, como o de Smart cities / Smart citizens, cujos modelos começaram a ser testados em pequenas e médias cidades, conferindo a possibilidade, pela via da tecnologia digital no que se refere à optimização do espaço urbano, tornam-nas mais apetecíveis, através da incorporação de novas tecnologias que darão origem a melhorias significativas na qualidade de vida das pessoas. Alargados aos novos avanços científicos do foro neuropsicofisiológico, concretamente no que toca às conexões sensoriais e emocionais entre o homem e a cidade, poderão levar a caminhos muito significativos para a renovação da qualidade de vida urbana que tanto ansiamos.

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