Apesar de ter sido através da política que mais se destacou, a engenharia e a arquitetura foram ferramentas que Pinheiro Braga soube usar com mestria e que merecem ser devidamente divulgadas. As obras do engenheiro famalicense sobressaem no núcleo urbano – a par de nomes como Arménio Losa, Ferreira de Almeida ou Alfredo Casais Rodrigues – sem que muitas vezes os próprios famalicenses tenham conhecimento da autoria. Ainda que de um passado recente, trata-se de património que constitui a identidade e memória coletiva de Famalicão, e como tal deve ser preservado e dado a conhecer.

Enquanto me encontrava a desenvolver uma investigação direcionada para os edifícios modernos dos anos 50 e 60 do centro da cidade, o nome “Eng.º Pinheiro Braga” surgiu por inúmeras vezes. Devo confessar a desconfiança devido ao título de engenheiro (não fosse eu arquiteta), mas que rapidamente se dissipou, ao encontrar projetos de uma plasticidade moderna associada a uma boa noção de espaço. Outro fator curioso nas obras do engenheiro, sobretudo nas balizadas entre as décadas referidas, é a identificação do progresso no estilo e linguagens utilizadas, que escalam de uma vertente que deriva do Português Suave para um estilo que vai de encontro à 2ª vaga do Moderno Português.

Década de 40
A partir dos finais da década de 1940, Famalicão vivencia uma grande dinâmica na área do urbanismo: projetam-se vários equipamentos, abrem-se ruas e avenidas, e consequentemente erguem-se novos edifícios. No entanto, a arquitetura, mesmo que nova, prefere uma linguagem tradicional, praticamente ausente de inovação. Pinheiro Braga foi um dos primeiros projetistas a trazer para a vila os novos paradigmas e plasticidades. Foi autor de obras de programas distintos, entre os quais religioso – foi responsável pelas obras de requalificação da igreja matriz de Vila Nova de Famalicão, pela construção do convento de São José (Santo Tirso), restauro da Arquidiocese de Braga; industrial – construção inicial das instalações da “Primor”, fábrica “Moutados”, Fábrica “7 Irmãos Unidos”; e habitacional.
Década de 70
Na década de 1970, Pinheiro Braga associa-se a dois jovens – Carlos e Sérgio – com quem forma o gabinete de engenharia EPAL (Engenharia, Projecto e Administração de Obras, Lda.).
Tomarei como exemplos dois dos edifícios mais assinaláveis, pelo vanguardismo moderno e qualidade arquitetónica. São eles: a “Habitação Manuel Palhares” (Rua Adriano Pinto Basto) e o “Edifício Bom Gosto” (Rua Vasconcelos e Castro).

A “Habitação Manuel Palhares”, número 30 da Rua Adriano Pinto Basto, projetado em 1956, é um bom exemplo de um exercício de transição da arquitetura mais tradicional para a de traço moderno. De volume paralelepipédico simples, e com elementos tradicionais – como a cobertura de quatro águas e o embasamento de pedra em aparelho irregular – existe uma reminiscência da cultura tradicional; no entanto a fachada e a organização espacial introduzem novas formas de pensar a casa. Faz-se de maneira mais evidente por meio dos planos horizontais que usam como material o granito, em aparelho irregular, sob a forma de parede ou pequeno muro de contenção. A platibanda é usada para esconder a cobertura de telha, um gesto que se repete nos anos 50/60, para alcançar uma imagem de fachada moderna, sem recorrer à cobertura plana, que não era ainda uma técnica completamente difundida. A organização espacial submete-se à hierarquização do espaço, quer ao nível exterior como interior.
Edifício emblemático: a Confeitaria Bom Gosto
De entre todos, o mais emblemático talvez seja o edifício da Confeitaria Bom Gosto, na Rua Vasconcelos e Castro, construído em 1959. A fachada moderna demonstra o domínio da nova gramática, mas respeitando os cânones no que se refere à hierarquia da fachada, com destaque para o piso térreo, em que o rés-do-chão se destaca do restante. As colunas e paredes são revestidas a gésite e através da utilização de cores distintas (muito ao gosto moderno), evidenciam a contraposição de elementos verticais e elementos horizontais. Na organização espacial interior destaca-se a mezaninne, de planta orgânica, que favorece o aproveitamento do espaço, num gesto livre e belo.
A R. Manuel Pinto de Sousa é uma das zonas em que a paisagem famalicense continua a ser marcada por Pinheiro Braga. Este edifício, em frente à Igreja Matriz, é de 1961 (fotografia: Diana Correia).
Memória e identidade
Importa divulgar a boa arquitetura que temos em Famalicão, não só, evidentemente, pela justa homenagem aos autores, mas também como forma de sensibilizar os famalicenses, os proprietários e técnicos, para que quando se trate de temas como a reabilitação, não se percam peças arquitetónicas que comportam consigo memória e identidade.

A propósito do centenário do nascimento do Eng.º António Pinheiro Braga, a Câmara Municipal de Vila Nova de Famalicão presta homenagem ao engenheiro-presidente, sob a forma de uma exposição fotográfica, captada pela ótica da fotógrafa Diana Correia e comissariada por Artur Sá da Costa. A exposição encontra-se patente ao público no Palacete Barão da Trovisqueira (Museu Bernardino Machado), local onde, por alguns anos, se situou o seu gabinete, desde 22 setembro e até 12 de novembro.
Imagem de destaque: Pormenor do edifício da Confeitaria Bom Gosto, na R. Vasconcelos e Castro, em Famalicão (fotografia: Diana Correia).
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