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O debate sobre a implementação legislativa da semana de 4 dias de trabalho traz, na minha forma de ver as coisas, a superação de um outro: o das horas semanais de trabalho.
Recordo-me de, há uns anos, ter lido que o Presidente da Câmara Municipal de Braga decidiu, por despacho, que os trabalhadores municipais não podiam ter um horário de 35 horas semanais, ainda que a lei isso lhes reconhecesse, mantendo-os no “regime” das 40 horas. Depois duma decisão judicial que anulou o dito despacho, percebeu-se que o Município de Braga terá de pagar a estes funcionários uma quantia de 3 milhões de euros pelas horas “a mais” que prestaram mas, infelizmente, nunca poderá ressarcir o custo pessoal e social para cada um dos visados. Tudo o que cada uma daquelas pessoas não pôde fazer com a redução de tempo de trabalho a que legalmente tinha direito já está perdido e suspeito que em termos de produtividade o saldo seja bem mais negativo do que se possa pensar. Basicamente perdeu-se tempo em volta de um conflito desnecessário que, em bom rigor, não é nem de direita, nem de esquerda.
Esta actuação ilegal mostrou um político de “vistas curtas” e com uma tendência conservadora assinalável. No entanto, não foi caso único.
Em 2018, o PS parlamentar juntou-se ao PSD e ao CDS para chumbar a alteração legislativa que permitia ampliar ao sector privado o tempo de trabalho de 35 horas semanais. Uma oportunidade perdida.
Porém, em 2022, percebendo as dinâmicas sociais ou quiçá procurando uma imagem progressista, o PS apresentou nas linhas estratégicas do seu programa às legislativas a promoção de um “amplo debate” sobre a semana de 4 dias assumindo, implicitamente, que a questão da redução das horas semanais de trabalho terá de voltar à agenda legislativa.
É que, para falarmos da semana de 4 dias de trabalho, temos de começar por saber se concentramos as 40 horas em 4 dias ou se as reduzimos e em que termos.
É claro que serão necessários ajustes e reajustes do mercado, dos trabalhadores, das empresas, de tudo. E, por isso mesmo, a questão fundamental seguinte é a de sabermos de quanto tempo precisa a nossa comunidade para se adaptar à semana laboral de 4 dias.
Há quem diga que 5 anos seria uma perspectiva séria. Outros há que dirão menos. Haverá quem diga que será necessário mais tempo e até haverá quem diga que a redução é impossível.
Há 100 anos, quando Edsel Ford, filho de Henry Ford, anunciou a intenção de a gigante multinacional fabricante de automóveis Ford Motor Company reduzir a semana de trabalho para 40h/5d recebeu um coro massivo de críticas quase idênticas às que hoje se atiram à redução para 4 dias. No entanto, em 2022, sequer imagino que alguém queira defender o retorno aos 6 dias de trabalho de sol a sol.
O debate sobre a semana de 4 dias de trabalho não pode ser parado e pode bem ser um instrumento decisivo para a sobrevivência das democracias avançadas.
Se as democracias falharem no seu objectivo de promoverem a paz e o bem-estar social poderemos assistir a um escancarar de portas aos populismos irresponsáveis e aos regimes totalitários. E, nesse caso, voltaremos atrás nos direitos laborais e em muitos outros temas fundamentais.
Que se avance com o debate!
Obs: texto previamente publicado na página de facebook de Célia Borges, tendo sofrido ligeiras adequações na presente edição.
Imagens: 0) DR 1) Antena / Unsplash
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