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Os estudos disponíveis indicam que, em Braga, as alterações climáticas serão um problema que trará consigo um aumento da frequência de fenómenos climatéricos extremos, tais como:
- mais dias de calor elevado;
- mais chuva muito intensa, com inundações subsequentes; e
- mais secas, devido a maiores períodos sem chuva.
Assim, as consequências das alterações climáticas serão, em primeiro lugar, visíveis nos cursos de água, especialmente naqueles que sofrem degradações causadas pela poluição, imprevidência governativa e pressões imobiliárias.
As alterações que a cidade de Braga submeteu ao Rio Este, dos últimos 70 anos, são bem ilustradas pelas imagens seguintes:
Verificamos a construção massiva ao longo das margens do Rio Este, bem como sobre as linhas de água afluentes:
- nos Pelames, junto ao Estádio 1.º de Maio, agora ocupado com campos de treino de futebol e com o estacionamento do Parque de Exposições;
- na Quinta de Sto. Adrião, agora ocupada com a Escola Alberto Sampaio e construção envolvente;
- em Lamaçães, diversos ribeiros agora quase completamente desaparecidos, dos quais o mais significativo será talvez o que agora se encontra encanado ao longo da Av. Frei Bartolomeu dos Mártires, sendo apenas visível num troço entre as Avenidas Robert Smith e Dr. António Palha; e
- nas colinas de Fraião e Nogueiró, verificamos que a construção não respeitou as linhas de água existentes.
No entanto, já podemos verificar melhorias, graças ao quadro legislativo, tratamento das águas residuais e investimentos em renaturalização do curso do rio, apesar de ainda insuficientes.
A Solução (ou parte dela):
O Rio Este e seus afluentes poderão ter um papel fundamental em lidar com os efeitos das alterações climáticas, se se verificar a necessária previdência e o investimento na recriação da sua infraestrutura natural:
- atenuando o calor extremo, via a inércia térmica da massa de água;
- retendo os excessos de afluência de água pluvial, via a reconstituição das suas bacias de retenção e leitos de cheia; e
- constituindo fonte alternativa de água, tanto para consumo humano como para rega dos espaços verdes da cidade, que por sua vez reduzirão as temperaturas localmente via o sombreamento e a evapotranspiração da água pela folhagem.
O que podemos fazer:
Vários factores permitem e obrigam ao planeamento e implementação no terreno das medidas necessárias, durante as próximas décadas:
- a necessidade imperativa de adaptação às alterações climáticas, sob pena de muito maiores prejuízos humanos e económicos;
- a disponibilidade de financiamento comunitário para as medidas de adaptação às alterações climáticas, incluindo a renaturalização dos rios;
- a previsão, na Estratégia Municipal de Adaptação às Alterações Climáticas apresentada pelo município em 2017, da reabilitação das galerias ripícolas e da criação zonas de retenção das águas pluviais;
- a desvalorização das construções nas áreas a intervir durante os anos 70, 80 e 90, agravada pela baixa qualidade e aproximar do fim de vida útil, que permitirá a sua aquisição paulatina pelo município; e
- a mudança cultural que já se verifica nas populações, que querem o rio de volta à cidade para melhoria da sua qualidade de vida.
A recuperação de parte do sistema implícito numa bacia hidrográfica é complexa. Exige análise e planeamento de forma holística, tendo em conta critérios que vão desde o mero custo/benefício até à defesa da biodiversidade e da qualidade de vida das populações.
É necessário não só defender a renaturalização do rio desde a sua nascente, na Serra do Carvalho, como das linhas de água que o alimentam.
Reconstituídas as galerias ripícolas, estas ajudarão a fixar no solo a água presente na atmosfera e resultante de precipitação, de modo a engrossar o caudal do rio e possibilitar o combate à seca e calor extremo.
Devolvidos os leitos de cheia ao rio, a par da criação de bacias de retenção adicionais, será possível gerir os picos de afluência de águas pluviais, reduzindo a ocorrência de cheias.
Uma breve análise da imagem de satélite permite identificar ainda parte dos afluentes do Rio Este, especialmente no Vale de Lamaçães. É viável a sua restituição à superfície, até mesmo a breve prazo, com mínimas interferências na malha urbana.
Outros locais obrigam a melhor planeamento, sendo exequível a implementação de acções concretas a prazo, para o que os instrumentos de gestão territorial devem estar preparados.
Exemplos:
Um dos exemplos mais famosos é a replantação, pelo Instituto Terra, de floresta em 600 hectares de terra devastada pela sobreexploração agroflorestal, no Estado de Minas Gerais, no Brasil. Promovida pelo casal Sebastião Salgado (o famoso fotógrafo da agência Magnum) e Lélia Wanick, em menos de 20 anos a floresta cresceu, trazendo de volta a água e a biodiversidade que tinham desaparecido.
Da mesma forma, as linhas de água desaparecidas sob as urbanizações dos últimos 70 anos podem ser, pelo menos em parte, recuperadas.
Outras cidades do mundo têm implementado processos de reclamação dos rios urbanos, ou seja, “daylighting” – “trazer à luz do dia”. Exemplos:
- O Rio Biévre, afluente do Sena que há mais de cem anos corre encanado sob Paris: Algumas secções têm voltado a ver a luz do dia, nos últimos anos, precisamente como parte do plano para combater as temperaturas elevadas que as alterações climáticas têm feito sentir com mais frequência.
- A cidade de Nova Iorque, EUA, devolveu à luz do dia o Saw Mill River, com enorme benefício local:
- o “bachkonzept”, em implementação há mais de trinta anos na cidade de Zurique, Suíça, tem devolvido vários riachos e nascentes à cidade; e
- o próprio Rio Este é exemplo de um rio que vem sendo devolvido à luz do dia e às populações, depois das graves agressões sofridas no último quartel do século XX e apesar das agressões que continua a sofrer.
Benefícios adicionais:
Além da resposta às alterações climáticas, a reposição do Rio Este e seus afluentes, nos moldes descritos, traria outros benefícios importantes, como por exemplo:
- Resiliência no abastecimento de água para consumo:
- Braga depende hoje quase exclusivamente do Rio Cávado para abastecimento de água, apesar de estar implantada na Bacia Hidrográfica do Rio Ave;
- a água do Rio Cávado chega à ETA da Ponte do Bico já sob grandes pressões da actividade humana, sendo as maiores ao nível da contaminação pelos efluentes provenientes da agricultura e das antigas minas abandonadas;
- da Ponte do Bico, a água é bombeada, com elevado custo, até reservatórios em redor da cidade de Braga, de onde abastece a população;
- assistimos ao reavivar da exploração mineira, agora de forma ampliada e a céu aberto, a montante de Braga (minas na Borralha e em Montalegre, por exemplo);
- um desastre mineiro, à imagem dos que pudemos assistir recentemente em Brumadinho ou Mariana (Minas Gerais, Brasil), ou Aznalcóllar (que quase destruiu o parque natural de Doñana, em Espanha), pode negar o abastecimento de água às populações.
- Abastecimento da futura rede municipal de rega:
- prevê-se que venha a ser obrigatória num futuro próximo, de modo a possibilitar a imprescindível rega estival das áreas verdes da cidade;
- o abastecimento de proximidade, via o Rio Este, é mais prático e económico que o do Rio Cávado, que obrigaria à execução de uma nova adutora.
- Qualidade de vida urbana:
- o tempo despendido em espaços abertos e ao longo dos rios é um fator importante para uma vida saudável, combatendo sérios problemas de saúde e sociais, incluindo obesidade, diabetes e depressão, entre outros;
- a recreação fluvial é uma grande oportunidade para melhorar as escolhas saudáveis e conectar as comunidades com o património natural;
- à medida que as pessoas passam mais tempo explorando seus rios, parques e terras ribeirinhas, o apoio para proteger esses lugares especiais aumenta, tecendo o sentimento comunitário.
- crescimento económico:
- Valorização do património edificado, bem como maior investimento na sua manutenção;
- Incremento da actividade turística, incluindo hotelaria e restauração mas também as actividades recreativas;
- Excelente cartaz publicitário para a cidade, em complemento de outros nichos de turismo existentes.
- protecção acrescida do Ambiente e da Biodiversidade:
- Criação de “corredor verde”, providenciando interconectividade entre habitats naturais;
- Interação dos habitats naturais com o interior da Cidade;
- Promoção da regeneração da Natureza.
Conclusão:
Dado as ameaças que as alterações climáticas, é imperativa a necessidade de adoptar políticas que visem a adaptação da cidade de forma a melhor lhes responder, de forma gradual mas assertiva;
As pressões das actividades humanas sobre o abastecimento de água da população aconselha a adopção de uma cultura de resiliência, com diversificação de fontes de abastecimento;
A renaturalização do Rio Este permitiria uma melhor interconectividade dos habitats naturais, defendendo a sua biodiversidade e preservação, bem como a melhoria da qualidade de vida urbana e valorização da economia local.
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Imagens: 0) Inácio Rodrigues, 1) Exército Português, 2) Google Earth, 3-4, 5-6, 7) DR
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