Desporto: ganhar ou perder! – Cecil Healy nos Jogos Olímpicos de Estocolmo, 1912

Desporto: ganhar ou perder! – Cecil Healy nos Jogos Olímpicos de Estocolmo, 1912

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Um acontecimento nitidamente contrário ao intragável fanatismo e ambição de alguns supostos eleitos, cujo único objectivo é vencer, mesmo à custa de atropelos e agressões à verdade dos mais “indesejados” princípios – inversa e felizmente que outros comportamentos se enquadram em parâmetros desejáveis.

Aconteceu nos Jogos Olímpicos de Estocolmo, em 1912, vinte e quatro dias seguidos de espectáculo, particularidade que emprestou ao fenómeno olímpico uma nova imagem, estampada no cuidado que os suecos dispensaram na sua preparação e execução. Afectados por uma concepção idealista herdada da Antiguidade Grega, os Jogos de Estocolmo foram, ainda, adornados com provas culturais, à luz dos princípios modernos, susceptíveis de gerarem pensamentos surrealistas, mas que, no mais profundo do âmago grego antigo, tinham perfeito cabimento. As ditas manifestações culturais em Estocolmo andaram pela área da pintura e da poesia.

Comportamentos desportivos?!

Maravilhoso o exemplar acto de cavalheirismo, fair play no seu mais alto grau, protagonizado pelo nadador australiano Cecil Healy que integrava a elite dos seus campeões, autor de um dos mais relevantes gestos. Para os australianos, a prova dos 100 metros livres revestia-se de muita preocupação, receosa da concorrência americana, uma equipa favorita à vitória final. Na piscina, o então nadador australiano Cecil Healy, especialista naquela distância e estilo, preparava-se para lutar pela medalha de ouro. Entretanto a organização havia dado pela ausência da equipa americana que ainda não havia chegado à piscina, aguardada até com alguma inquietude e preocupação. Quando os americanos se apresentaram na área da piscina já o Júri responsável havia dado como findo o tempo legal exigido e relativo à presença de uma equipa no espaço de competição – deliberou atribuir a vitória à equipa australiana alegando, obviamente, falta de comparência. De imediato, os responsáveis americanos tentaram uma justificação, alegando ter havido um contratempo, algo involuntário que motivou o não cumprimento do horário. Como a equipa organizadora da área das provas de natação se mostrou irredutível, os americanos apelaram a um júri especial, uma espécie de última instância. Contrariamente ao que os responsáveis haviam decidido, o nadador australiano Healy, em representação da sua equipa, solicitou ao Júri de recurso que atendesse as justificações dos americanos e com tal veemência que foram mesmo autorizados a participar nessa final dos 100 metros livres. Uma oportunidade para recordar que dessa equipa americana fazia parte o célebre Duke Kahanamoku, um nadador havaiano que liderava o topo das tabelas mundiais.

A final foi disputada e até vencida pelo referido Duke, seguido do australiano Cecil Healy e de Kenneth Huszag, terceiro, igualmente dos Estados Unidos. Concluindo: os australianos ao solicitarem a anulação do castigo e a referida inclusão dos americanos, acabaram por perder a final daqueles 100 metros livres. Mas o mais impressionante haveria de acontecer no final da prova, o público assistente, de pé, aplaudiu freneticamente, a equipa australiana, a derrota de Healy, um homem que iria interromper a sua carreira por motivo da Primeira Guerra Mundial, conflito em que foi integrado. Morreu, em combate, faltava pouco tempo para a assinatura do armistício – perdeu-se um desportista, um campeão!

Cecil Patrick Healy tinha-se alistado, em Setembro de 1915, na denominada Força de Defesa Australiana e serviu a pátria no Egipto e na França como intendente no posto de sargento. Frequentou um curso para oficiais em Cambridge e seguiu a carreira militar como segundo tenente em Junho de 1918 no Batalhão Sportsman/19.

Morreu em combate na Batalha de Somme, durante um ataque a uma trincheira ds tropas alemãs e está sepultado em Assevillers no Nono Cemitério Inglês. Este atleta, nadador, Cecil Patrick Healy, australiano, nasceu em 28 de Novembro de 1881, em Darlinghurst, New South Walese faleceu a 29 de Agosto de 1918, muito novo, trinta e seis anos de idade.

Muito cedo, também deu início à prática natatória e durante a primeira década do século vinte teve oportunidade de se destacar no panorama australiano e mundial (prata nos Jogos de Estocolmo nos 100 metros livres e ouro nos 4×200 m) – foi o segundo nadador a representar a Austrália em provas internacionais.

Era oriundo de Darlinghurst, um espaço da cidade de Sydney e ainda no início da sua educação, em pleno ensino básico, acompanhou a família na sua mudança de domicílio para Sydney devido à ocupação profissional do chefe da família, um advogado. Foi precisamente em Sydney que Healy foi aliciado para a natação – foi integrado no Oriente Sidney Swimming Club, instituição frequentada também pelo seu colega nadador australiano Frederick Lane.

Healy desenvolveu o estilo “livre”, o conhecido “crawl”, sendo até alvo de reparos jocosos dos companheiros de clube que apontavam como deselegante a sua maneira de nadar! O patamar alcançado, muito breve levou os responsáveis australianos a inseri-lo no grupo de atletas que em 1906 participou nos célebres Jogos Intercalares de Atenas, uma iniciativa do dealbar do Olimpismo Moderno que não vingou – quedou-se pelo terceiro lugar na prova dos 100 metros livres, prova dominada pelo americano Charles Daniele e pelo húngaro Zoltan Halmay, dois atletas  que se haviam destacado dois anos antes nos Jogos de Saint Louis, em 1904. Saiu-lhe frustrada a ida aos Jogos Olímpicos de 1908 por manifesta desordem organizativa devido à ausência de apoios financerios.

Até 1912, ano dos Jogos Olímpicos de Estocolmo (a Austrália fez parelha com a Nova-Zelândia) deu continuidade ao seu reinado atlético com bastante sucesso – edição em que Healy iria protagonizar o seu acto de claro desportivismo que, em termos práticos lhe custou a medalha de ouro! Aproveitando uma oportunidade de se deslocar à Europa, protagonizou uma digressão por alguns países onde mostrou as suas capacidades.

Antes do regresso a casa teve ensejo de patentear as suas capacidades por város países da Europa e encetar o trabalho de nadador salva-vidas na praia australiana de Manly com um desempenho notável no apoio aos surfistas que ali abundavam e que lhe valeu uma condecoração da Real Sociedade Humanitária.

Ainda teve oportunidade de escrever um livro na área da natação, mais concretamente da técnica e o treino do crawl que teve uma tiragem notável.

Em 1981 foi agraciado com a International Swimming Hall of Fame.

Imagens: (0) ABCNews, (1) Olle Hjortzberg, (2) PLB, (3) DR, (4) Swimswam

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Categorias: Crónica, Desporto

Acerca do Autor

Ilídio Torres

Membro da Academia Olímpica de Portugal, órgão do Comité Olímpico de Portugal.

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