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As pessoas mais velhas são uma importante fonte de informação ecológica, mesmo em espécies raras ou localmente extintas, e o seu saber deve chegar às novas gerações, para que haja uma maior consciência e defesa da biodiversidade. A conclusão é do investigador Ronaldo Sousa, da Universidade do Minho, num estudo hoje publicado na revista “Science of the Total Environment“. O trabalho baseou-se em 200 entrevistas feitas em 2019 nas aldeias junto aos rios Cávado (concelho de Montalegre) e Neiva (concelhos de Esposende e Barcelos), sobre a presença passada e recente do mexilhão de água doce, que está sob severa ameaça em Portugal e na Europa.
No rio Cávado, amostragens recentes concluíram que a espécie está provavelmente extinta, mas quase 50% dos entrevistados, sobretudo as pessoas idosas, lembraram-se da sua existência naquele curso de água até final da década de 90. No rio Neiva, a espécie ainda está presente mas apenas 4% dos entrevistados se recordaram da sua existência. A poluição e as barragens foram citadas como as principais razões do declínio desta espécie, com o nome científico Margaritifera margaritifera. “Os mais velhos conhecem com detalhe a condição dos ecossistemas passados e a sua biodiversidade, como sucede no caso deste invertebrado difícil de ser observado – e isso revela que essas pessoas teriam antigamente uma maior conexão aos habitats naturais”, nota Ronaldo Sousa, investigador do Centro de Biologia Molecular e Ambiental (CBMA) e professor do Departamento de Biologia da Escola de Ciências da UMinho, em Braga.
Jovens desconheciam que há mexilhão “tão afastado do mar”
Os inquiridos que contactavam regularmente com o rio (pastores, pescadores, lavadeiras) “lembraram-se perfeitamente” do mexilhão de água doce e, ao ver as suas conchas durante a entrevista, expressaram alegria e felicidade, evocando vivências da sua infância e da estreita ligação ao rio, diz Ronaldo Sousa. Já a maioria dos entrevistados mais jovens respondeu que “é impossível” encontrar este tipo de espécies a distâncias tão afastadas do mar. “A informação retida pelas pessoas idosas precisa de ser levada às novas gerações, pois não podemos conservar espécies se desconhecermos a sua existência e a biodiversidade atual e passada”, continua o biólogo da UMinho. Aliás, no estudo, muitos dos inquiridos com maior conhecimento ecológico superavam os 80 anos de idade. “Corre-se o risco de perder este saber, por isso a sua partilha é urgente”, anui, sugerindo que instituições locais, grupos de investigação e escolas deveriam cooperar nesse processo.
O acentuado declínio na distribuição e abundância do mexilhão de água doce em Portugal requer planos que visem a sua conservação. A espécie tem um ciclo de vida de mais de 50 anos e as suas larvas precisam de um peixe hospedeiro para completar a metamorfose. “Estas caraterísticas naturais e as crescentes pressões humanas – mudanças climáticas, poluição, pesca excessiva, barragens e introdução de espécies invasoras – tornam a sua conservação muito difícil”, afirma Ronaldo Sousa. Este investigador propõe várias ações, como restaurar populações desta espécie no Cávado e Neiva, incluindo a criação de áreas protegidas, restauração de habitats e produção de juvenis em cativeiro e posterior libertação.
No estudo referido – que tem a colaboração de investigadores da Universidade do Porto e do Instituto Politécnico de Bragança –, o grosso dos inquiridos concordou em contribuir financeiramente (ou com trabalho voluntário) se as administrações locais ou nacionais apostassem na recuperação do mexilhão de água doce. Ronaldo Sousa apela que os decisores considerem os resultados desta investigação, reabilitando a espécie Margaritifera margaritifera em troços fluviais nos quais fez historicamente parte do ecossistema e da própria cultura das gentes locais.
Fonte e Imagens: UMinho
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