Brocardos | A cavalo dado não se olha o rabo

Brocardos | A cavalo dado não se olha o rabo

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Gostei deste título, e não faço a mínima ideia do que vou escrever a seguir, o que não abona muito a favor do cronista, que para contar alguma coisa de jeito, dizem os manuais, deve gizar um plano prévio de escrita.

O meu plano é não ter plano nenhum. Escrever a galope do que me for na alma, cavalgando a toda a sela esta insanidade que é pintar a vida com palavras.

Podia falar de futebóis, de políticos, da malvada pandemia, de mulheres, de praias vigiadas, da restauração falida, até da independência que nunca se cumpriu ou efectivou, entre tantos outros temas, mas não… vou falar mesmo é de rabos…

De cavalo pois claro, e mesmo de longas barbas, tão em moda. Vou falar das coisas mais redondas que me apetecer.

Diz o povo que “quem tem cu tem medo”, mas o povo é muitas vezes injusto nas suas apreciações, pois conheço muita gente que não o tem. Nem cu, nem medo.

Está a haver aqui uma mistura de vocábulos, estou consciente disso. Rabo, está bom de ver, nem sempre é o mesmo que cu.

Alguns animais têm os dois, alguns homens também. Principalmente o rabo preso, como sejam os tais políticos, os lambe-botas e por aí acima.

É gente defecada, sem eira nem beira, mas que decide, por estranho que pareça, muito daquilo que é a nossa vida.

Clarifiquemos as coisas, rabo bom mesmo é aquele de tanguinha, nas praias de norte a sul, inspiração de mirones escondidos e às claras.

Há quem dê a vida por um, principalmente aqueles cuja vida é uma coisa meia insonsa, situada algures entre qualquer coisa sem sentido e coisa nenhuma.

Há quem não lhe ligue patavina, por exemplo os alfa-rabistas, mais interessados em papéis mofados, ou quem dê o respectivo por ele, como por exemplo os cu-merciantes.

Meio perdido do que quero desta crónica, vieram-me à ideia «Os cus de Judas», de António Lobo Antunes, que começa desta forma deliciosa:

“Do que gostava mais no Jardim Zoológico era do ringue de patinagem sob as árvores e do professor preto muito direito a deslizar para trás no cimento em elipses vagarosas sem mover um músculo sequer, rodeado de meninas de saias curtas e botas brancas, que, se falassem, possuíam seguramente vozes tão de gaze como as que nos aeroportos anunciam a partida dos aviões, sílabas de algodão que se dissolvem nos ouvidos à maneira de fios de rebuçado na concha da língua.”

O livro, ao que consta, foi recusado por várias editoras, até alguém lhe pegar e ter afirmado o eterno merecedor do Nobel.

Um título pode enterrar um autor, e nesse sentido, espero que o meu bom amigo Pedro Afonso não recuse à partida esta minha crónica morfológica, que me saiu não sei bem de onde e caminha no mesmo sentido.

A página do word mudou para outra. Isso diz-me que a crónica está a chegar ao fim e que devo começar a preparar a minha saída desta escrita, se possível com chave de ouro, coisa que nos tempos de hoje é um luxo.

Estou como no início, não me vem nada à cabeça, mas estou convencido que com um derradeiro esforço vou conseguir.

(pauso durante um minuto, bebo um pouco de vinho).

No fundo, no fundo, eu escrevi este texto como quem canta uma canção. Festivaleira é certo, mas o que importa mesmo é não estar quieto.

Estar quieto é ser como o «Pensador» de Rodin, que parecendo estar a fazer aquilo em que estão a pensar, está mesmo a pensar.

Eu também.

Ele há “cauda” coisa…

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Categorias: Crónica, Sociedade

Acerca do Autor

José Ilídio Torres

José Ilídio Torres nasceu em Barcelinhos em 1967. Estudou Direito e Arqueologia, mas acabou licenciado em ensino, variante de educação física, leccionando ao 1º e 2º ciclo do ensino básico. É formador em futebol há cerca de 20 anos. Trabalhou como jornalista na imprensa regional, em jornais como o Notícias de Barcelos e Primeiro de Janeiro, bem como na Rádio Cávado. É autor de 11 livros, em romance, conto, infanto-juvenil e poesia. Foi deputado municipal em Barcelos e candidato à Câmara Municipal pelo Bloco de Esquerda, tendo-se afastado recentemente da vida política activa.

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