O Amor – monólogo a quatro mãos

O Amor – monólogo a quatro mãos

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Ninguém nasce para estar só e sem amor, por mais afinidade que tenha com a solidão.

O mundo está preenchido de gente só, na maior parte dos casos sem ter escolhido essa condição, ou sequer ter-lhe sido dada a possibilidade de escolher.

Pode estar-se só com muita gente dentro de nós, e pode estar-se acompanhado por poucos. Um apenas.

Não é o número que conta, aliás números não passam disso: números.

Sempre fui mau a fazer contas, e nas dos afectos, as que sempre contaram para mim, foram as de multiplicar, aqueles em que sempre me enganei. O resultado era sempre maior que a conta…

Também nunca soube dividir. Há mal nisso?

Ensino aos meus alunos que a operação contrária da multiplicação é a divisão, mas pergunto-me continuamente, se, enganando-me a multiplicar, não me engano sempre a partilhar.

É que, para partilhar, a casa da divisão chama-se coração, e o resto, esse obtém-se por sucessivas subtrações.

Subtraímos os que nos fizeram ou fazem mal, esperamos um resto zero, mas se o resto for outro, é nesse que temos que centrar uma atenção redobrada, porque foram afinal sempre esses que nos preencheram os dias.

A melhor forma de escrever a vida chama-se erro.

É nele que definimos o rosto da noite e do dia, do sol e do luar, do bem e do mal, se quiserem.

Não há mal nenhum em errar continuamente. Qual é o relógio que não se atrasa? Os suíços não são exemplo.

Se cada um achasse que era perfeito, não precisava do outro para nada. Amava-se como um narciso. Masturbava continuamente os dias, e podia até, na ilusão de que não cometia erros, ascender ao divino.
O problema é que a vida ensina-nos pelas falhas, na queda. Erguem-se do chão os mais fortes, mas mesmos aos que não conseguem levantar-se,  é sempre dada a oportunidade de ver nascer o sol, de sentir a chuva, o vento, a terra molhada.

De que umbigo nascemos?

Do umbigo da nossa mãe, ou do umbigo da terra?

Como se diz ao pior inimigo que o amamos? Com que fel escrevemos as palavras na boca?

E a ambição? Alguém já dormiu com ela?

Escrevo este texto a quatro mãos. Duas são minhas, as outras duas de quem quiser.

Das mulheres que amei, dos filhos que gerei. Da angústia, da fome de ir mais além, e da traição.

Sim, da traição. É preciso contar com ela. Esconde-se sorrateira no sorriso. Saiba cada um distinguir o amarelo.

O que faz pulsar o mundo não é, nem nunca será, a vingança. Essa morre sozinha, num inferno à medida de quem a pratica.

A cura do mundo cabe em quatro letras. Falso palíndromo.

Roma e Pavia não foram feitas num só dia, assim como afinal o mundo, mas o amor, esse, é um fósforo que arde num segundo.

Torná-lo permanente é a mais difícil arquitectura a que cada um se pode propor.

E se o amor fosse uma pandemia?

Um vírus mortal chamado estupidez

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Acerca do Autor

José Ilídio Torres

José Ilídio Torres nasceu em Barcelinhos em 1967. Estudou Direito e Arqueologia, mas acabou licenciado em ensino, variante de educação física, leccionando ao 1º e 2º ciclo do ensino básico. É formador em futebol há cerca de 20 anos. Trabalhou como jornalista na imprensa regional, em jornais como o Notícias de Barcelos e Primeiro de Janeiro, bem como na Rádio Cávado. É autor de 11 livros, em romance, conto, infanto-juvenil e poesia. Foi deputado municipal em Barcelos e candidato à Câmara Municipal pelo Bloco de Esquerda, tendo-se afastado recentemente da vida política activa.

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