Viagem Sensorial e Emocional pela Arquitectura de Braga

Viagem Sensorial e Emocional pela Arquitectura de Braga

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Fazer uma viagem sensorial e emocional pela história da Arquitectura de Braga, em tão poucas palavras, é uma aventura arriscada a que me proponho pelo seu instigante exercício. Significa olhá-la do ponto de vista sócio-antropológico e recuar à sua Pré-história. Significará ainda testemunhar, através dos vestígios arqueológicos e dos edifícios históricos mais fascinantes, expressões visuais e estéticas que identifiquem factores neuropsicofisiológicos de cada época, em que o homem encontrou no espírito criativo o verdadeiro paradigma cognitivo, a partir do qual se deu a aptidão da arte em dar respostas ao seu tempo.

Mamoa de Lamas e a fixação de populações no Neolítico

A ainda recente descoberta da Mamoa de Lamas, do período Neolítico, veio dar consistência aos que defendiam a existência de um povo aqui fixado desde a Idade do Bronze, representativo do fim da Era do predomínio emocional. Este facto constituiu a passagem do domínio do mundo animal para o do cultivo, com o aparecimento dos primeiros agricultores e pastores nesta região, situada na fértil província do atual Minho, desde o Rio Cávado até ao Rio Ave e também atravessada pelo Rio Este.

Castro da Cividade na origem de Bracara Augusta

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O teatro Romano de Braga, posto a descoberto há poucos anos atrás, único exemplar do género conhecido em Portugal, evidencia bem a relevância de Bracara Augusta (Imagem: José Rocha).

O aparecimento da agricultura levou à sedentarização e à necessidade de viver em comunidade, como o provaram as descobertas da citânia de Briteiros e dos vários castros espalhados por toda a região, como o da cividade do tempo dos Brácaros, tribo galaico-celta, que dá origem ao nome da cidade conquistada pelos romanos (250 a.C.), renomeada Bracara Augusta, em homenagem ao Imperador César Augusto. Mais tarde elevada a capital da província da Galécia por Diocleciano, seria uma das principais cidades do Império Romano, uma das mais antigas cidades cristãs do mundo e a mais antiga de Portugal.

Consagração do Cristianismo

Na altura começa a fazer-se sentir o intercâmbio estético entre as grandes metrópoles da arte romana, com uma nova harmonia, entre o que é belo e o que é útil, com vista à consolidação de uma arte europeia funcional. A construção é assumida tendo em conta a utilidade e a comodidade dos indivíduos, o que levaria à condição de possibilidade de uma Era da Razão, confirmada pelo anúncio das primeiras Leis entre a fé e a Razão, consagrada pelo Cristianismo e por todas as correntes filosóficas racionalistas da Idade Média, onde a Arquitectura encontrou no pensamento da época a construção da Razão.

Capela de S. Frutuoso de Montélios e Braga Sueva

Após a queda do Império Romano do Ocidente (250 d.C.), os bárbaros iriam alterar radicalmente a organização da Europa, como aconteceu com os Visigodos na Península Ibérica, com a conquista da Hispânia, e com os Suevos na Galécia, até 585 d.C. Foi neste período que foram anexados pelos Visigodos e que estiveram na origem da Capela de S. Frutuoso de Montélios, considerado o monumento mais bizantino da Arquitectura visigótica na Península Ibérica. Representativos da viragem ideológica relacionada com a influência que o mundo sensível e o mundo inteligível da cultura oriental tiveram no Cristianismo, encontram-se novos conceitos como o de esquema central, forma de afirmação representativa do ideal cristão.

A invasão árabe e a Reconquista cristã

Com a invasão árabe, a organização eclesiástica suevo-visigótica transferiu-se para Lugo levando a resistência cristã a recuar até às Astúrias. Assistiu-se ao colapso urbano, ao despovoamento, ao caos, dada a importância religiosa que Bracara Augusta possuía até então. Durante esse período, a cidade fica reduzida às suas fundações e é abandonada durante mais de duzentos anos, sobrando muito pouco daquilo que fizera parte da Arquitectura Romana, apenas alguns vestígios arqueológicos, como o balneário pré-romano, as termas do alto da Cividade, a Fonte do Ídolo em S. Lázaro, o único teatro Romano a céu aberto em Portugal, descoberto recentemente em Maximinos, e parte do traçado do tecido urbano, como são o caso da estreita Rua Dom Gualdim Pais e o Largo do Paço Arquiepiscopal.

Após o processo de Reconquista cristã, no Séc. XI, a cidade de Braga foi reorganizada com a construção da muralha citadina e a reconstrução da Sé, por ordem do primeiro Arcebispo D. Pedro de Braga, sobre o antigo templo romano dedicado a Ísis. Neste aspecto, faz-se também sentir a influência dos muros de uma posterior basílica Paleocristã, atribuída aos monges de Cluny que começaram a exercer a sua influência na Península Ibérica. É neste período que o Românico surge como o primeiro grande estilo europeu, resultante da reforma gregoriana, em que a arte se colocaria ao serviço de um ideal unificador dos territórios cristãos com vista à prosperidade material e renovação espiritual.

A fundação da nacionalidade

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Após o processo da Reconquista cristã, a Sé Catedral foi reconstruída sob os auspícios do Arcebispo D. Pedro de Braga, no Séc. XI.. Dessa construção sobram hoje apenas alguns vestígios. A Sé atual começaria a tomar forma ainda antes da fundação da nacionalidade, no Sécs. XII (Imagem: José Rocha).

Após o processo da Reconquista cristã, a Sé Catedral foi reconstruída sob os auspícios do Arcebispo D. Pedro de Braga, no Séc. XI.. Dessa construção sobram hoje apenas alguns vestígios. A Sé atual começaria a tomar forma ainda antes da fundação da nacionalidade, no Sécs. XII (Imagem: José Rocha).
No tempo em que o Conde D. Henrique e a Condessa D. Teresa, pais daquele que viria a ser o primeiro Rei de Portugal, D. Afonso Henriques, herdaram a cidade e ali fundaram o Condado Portucalense. Este iria elevar a cidade ao bispado bracarense. A cidade dos Arcebispos recuperaria então a sua importância no panorama ibérico. A Sé de Braga iria sofrer alterações várias ao longo da sua história, com os mais variados sucessores, com a entrada de vários estilos arquitectónicos como o Gótico, o Barroco e o Manuelino, passando paulatinamente da razão para a emoção e, por isso, tornar-se-ia muito mais atractiva.

O Barroco, o Manuelino e o Neoclassicismo

O Arcebispo D. Diogo de Sousa – que fizera doutorado em Paris, reconhecido pelo seu espírito iluminado, resultante das suas experiências e vivências que alargaram a sua visão, introduziria alterações profundas no tecido urbano da cidade, com a criação de importantes praças. Ampliá-la-ia para fora das muralhas e contribuiria também para o enriquecimento social e cultural com a criação do primeiro colégio na cidade.

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Palácio dos Biscainhos – acesso principal. Este palácio situa-se quase no coração de Braga. Construído em estilo Barroco encontra-se profundamente revestido de azulejaria e possui um belíssimo e tranquilo jardim tão ao gosto da época (Imagem: José Rocha).

Braga, também conhecida por muitos como a cidade do Barroco, deu lugar aos mais espectaculares edifícios deste período em Portugal, casos da Igreja da Falperra, a Casa do Raio, a Câmara Municipal, o Palácio dos Biscainhos, a Capela da Nossa Srª. da Torre, a Capela dos Monges nos Congregados, entre outros.
O espírito dualista entre o Racionalismo e o Empirismo, que se vivia na Europa, iria provocar diferentes tendências no Barroco. Ora se aproximava ao Renascimento, ora ao Neoclássico, ou ainda às primeiras experiências anticlássicas que deram origem ao Rocócó, que levariam ao exagero as componentes criativas do Barroco, destacando-se os seus frontões, as paredes de formas côncavas e convexas e os exageros decorativos, que tinham por objectivo passar sensações de prazer como meio para o alcance da felicidade. A grande fantasia das obras de André Soares, personalidade audaz, sensível, altamente criativa, levaram-no a ser o máximo representante do Barroco em Braga e em Portugal.
A Arquitectura deste período passaria a ter um significado psicológico, o segundo momento da passagem da Era da Razão à Emoção, após o Gótico, por todo o dinamismo que o Barroco e toda a experiência plástica e volumétrica em movimento empregava nos seus edifícios.
O final do Século XVIII, marcado por significativas mudanças em termos políticos e sociais, revitalizaria o interesse pela antiguidade. Descobertas arqueológicas, entretanto realizadas, trariam novos dados sobre o passado, na altura em que se fazia o contraponto estético com as extravagâncias e os excessos levados a cabo pelo Barroco e pelo Rococó. Alguns Arquitectos passariam a ter uma visão mais classicista, outros um olhar mais romântico, procurando a pureza, o equilíbrio e a simplicidade. Surge então o Neoclássico que encontra em Carlos Amarante o seu principal precursor na cidade de Braga, onde se destacam o Bom Jesus, a Igreja do Pópulo e a Igreja do Hospital.
A expressão dos movimentos arquitectónicos que se seguiram foi continuada mais discretamente na cidade e arredores, ao estilo Manuelino, como foi o caso da Casa dos Coimbras, com o Gótico tardio português ou flamejante, e composições mais ecléticas dos palácios e das casas senhoriais no período romântico e historicista, como o Palácio D. Chica, do Arquitecto suíço Ernesto Korrodi, já na fase em que a Era da Emoção na Arquitectura atingirá o seu expoente.

Braga contemporânea e um Estádio vencedor de um Prémio Pritzker

estádio municipal de braga - estádio da pedreira - braga

O novo Estádio Municipal de Braga, mais conhecido pelo Estádio da Pedreira, recebeu em 2012 o maior prémio internacional de arquitetura, o Prémio Pritzker. Eduardo Souto Moura é o autor do projeto (Imagem: José Rocha).

Por último, não nos podemos esquecer do período do regime – Estado Novo – que determinou e conferiu à Arquitectura um estilo nacionalista, com uma série de edifícios públicos deste período, do boom da construção das décadas de 80 e 90 e, mais recentemente, o edifício que mereceu o Prémio Pritzker 2012, o Estádio Municipal de Braga, da autoria de Eduardo Souto Moura, que fez esquecer muito o que de mau foi feito nos últimos anos, pela forma como a cidade se descaracterizou.

Braga, uma cidade com história incomparável

Braga não tem mar nem tem um grande rio, mas tem um povo e uma arquitectura com uma grande história.

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A arte poética – experimentação da impossibilidade

Imagem de destaque: Bom Jesus (Pedro Araújo Napoleão).

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Acerca do Autor

Pedro Araújo Napoleão

Pedro Araújo Napoleão nasceu em Vila Nova de Famalicão em1972. É licenciado em Arquitectura pela Universidade Lusíada de Vila Nova de Famalicão. Diplomado em Estudos Avançados em Expressão Gráfica Arquitetónica pela Universidade da Corunha. Doutorado com a Tese de doutoramento “As Sensações e Emoções na Arquitetura” pela Universidade da Corunha. Exerce a sua atividade profissional na Panatelier - Pedro Araújo & Napoleão, Lda, desde 1997. Trabalhou como Director Técnico no Grupo CRB em Paris entre 2012 e 2015. Actualmente integra o Grupo de Investigação em Representação Arquitectónica da Universidade da Corunha.

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